18 Janeiro 2024      17:29

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O que perde o mundo se Vila Viçosa não for Património da Humanidade?

Vila Viçosa entregou na passada segunda-feira a proposta de candidatura a Património Mundial da UNESCO, com a designação Vila Viçosa – Sede Ducal. Este foi o culminar do primeiro capítulo de uma nova etapa, que ainda tem um caminho por percorrer. Foram quase dois anos de um extenso trabalho de investigação, com uma nova coordenação, que permitiu fundamentar de forma objetiva e rigorosa a nova proposta, seguindo de forma escrupulosa e sem desvios os parâmetros definidos pela UNESCO.

De acordo com o estabelecido pela Comissão Nacional deste organismo das Nações Unidas, foram apresentados três dossiers, com diferentes conteúdos: formulário de candidatura, plano de gestão e estudos históricos, cada um deles com as suas especificidades.

Estes renovados documentos apontam para novos caminhos e pretendem demonstrar, com evidências concretas e de forma inequívoca, as razões pelas quais Vila Viçosa se candidata. A singularidade da Casa de Bragança e as repercussões da sua influência, a nível global, esteve na base de uma nova orientação.

A partir de Vila Viçosa, irradiou para todas as partes do Mundo o conhecimento sobre a importância da corte brigantina sediada no coração do Alentejo e o protagonismo assumido pela Vila Ducal a nível político, militar, cultural e religioso, cujo eco se estendeu um pouco por todo o antigo império português.

Temas como a Tapada Real e a preservação do montado, a perspetiva política a nível da afirmação do poder da Casa de Bragança, baseada no culto a Nossa Senhora da Conceição, o alargamento da área candidata, integrando novos espaços e edifícios e a integração dos “tesouros escondidos”, a nível do património integrado das antigas casas senhoriais, juntamente com a arquitetura em mármore, são agora elementos fundamentais, nos quais assenta a renovada estratégia de candidatura.

A projeção internacional da casa ducal a nível cultural e artístico, é um fator preponderante, que revela a influência exercida pelos Braganças nos séculos XVI e XVII.

Neste novo caminho, a Fundação da Casa de Bragança assumiu um papel fundamental na co-promoção da candidatura, tendo em conta o facto de grande parte do património calipolense estar sob a sua tutela. A inclusão desta importante instituição no âmbito da candidatura, detentora de um vasto e rico património em Vila Viçosa, foi fundamental. A parceria agora estabelecida é reveladora dos comuns interesses nos objetivos que foram definidos e na forma como se abordaram os planos para o futuro.

Muito para além do desejável retorno que possa advir de uma eventual classificação, o importante é que Vila Viçosa soube dar as mãos para o início deste percurso agora renovado e que contou com a participação da comunidade na sua definição.

Este aspeto deve ser salientado. O envolvimento das associações, coletividades, instituições locais, empresas e outras entidades, numa lógica de partilha, permitiu que fossem sendo limadas arestas e integrados contributos de diferentes proveniências, que sem dúvida enriqueceram o resultado final deste primeiro capítulo. O processo saiu dos gabinetes e foi ao encontro das pessoas e dos seus contributos e preocupações.

A preparação dos três volumes decorreu de forma democrática, com a inclusão de diferentes perspetivas sobre a evolução histórica de Vila Viçosa e a forma como a sua história se revelou determinante, não somente em termos nacionais, mas também a nível internacional. Foram muitos os investigadores e especialistas que se debruçaram sobre o tema e contribuíram, com os seus estudos, para a definição de conteúdos. O trabalho de equipa, com a coordenação do Arq. Nuno Lopes, foi uma realidade e sem dúvida que contribuiu para o resultado final.

Convêm recordar que este projeto é uma ambição há muito desejada pelos Calipolenses, que conheceu ao longo de várias décadas avanços e recuos, mas que agora dá um passo fundamental para a sua desejável concretização. Ainda que as expectativas possam vir a ser goradas, o que não prevemos, nem tampouco desejamos, a verdade é que em conjunto conseguimos trabalhar em prol de um objetivo comum, que trará seguramente benefícios para a nossa comunidade.

Haverá necessidade no futuro de encontrar equilíbrios entre dinâmicas económicas, vinda de turistas e conservação do património, em que todos teremos que assumir, em diferentes segmentos, as nossas responsabilidades. O futuro depende de nós!

As intenções e os trabalhos não estão obviamente concluídos. Há um longo caminho a percorrer e a necessidade de compromisso entre todos, para que se chegue a bom porto. É fundamental continuar a proteger o património, resolver os problemas existentes e contribuir para o estudo e a salvaguarda dos bens, sobretudo dos que se encontram em risco, abrindo, sempre que possível, esse legado à fruição pública.

Esse diagnóstico necessita de uma monitorização constante e da definição de uma estratégia conjunta entre todos os parceiros, de modo a concretizar, na prática, todas as intervenções que estão previstas no plano de gestão agora apresentado e que terá seguramente um horizonte temporal dilatado. Nesse sentido, o compromisso político, social e cultural terá também que ser vasto e adaptado às circunstâncias.

Na minha opinião, a proposta de candidatura agora apresentada à UNESCO, com as suas diferentes valências, contempla um vasto conjunto de informações que legitimam a ambição de Vila Viçosa se querer assumir como Património da Humanidade. Do ponto de vista técnico e gráfico, o resultado final deste primeiro capítulo, depois de vários esboços e rascunhos anteriores, é irrepreensível. Bem sei que sou suspeito, mas penso que está devidamente descrita e fundamentada a intenção.

Conjuntamente com Évora e Elvas e para além do Cante, Arte Chocalheira e Bonecos de Estremoz, a classificação de Vila Viçosa como Património da Humanidade pode contribuir para a criação de um importante eixo cultural no Alentejo, com uma projeção destacada de âmbito internacional, aliada à restante oferta existente a nível gastronómico, cultural e ambiental, entre outras.

Diria que esta candidatura é agregadora e representa ao melhor nível o interesse de Portugal no que concerne a esta matéria. Não há português que conheça que não se orgulhe de Vila Viçosa, da sua história e dos seus monumentos e do legado que deixou ao longo de séculos, transposto para os mais recônditos lugares do globo. Essa marca de portugalidade dispersa pelo Mundo também tem muito de Vila Viçosa!