15 Março 2015      22:54

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Barrancos homenageia "Schindler da Raia"

O Município de Barrancos  inaugura hoje pelas 16:00 um monumento dedicado aos acontecimentos da Guerra Civil de Espanha e um Largo Tenente António Augusto de Seixas, que salvou cerca de um milhar de cidadãos do massacre das tropas franquistas, fato que lhe deu a alcunha de "Schindler da Raia".

 A cerimónia conta com as Boas vindas aos participantes por parte da Vice-Presidente da Câmara Municipal, a interpretação pela banda Filarmónica “Fim de Século” de Barrancos dos hinos de Portugal, Espanha e Barrancos e o descerrar da placa toponímica. Uma nota a reter é que ao longo da duração dos três hinos serão executadas honras militares pela GNR – Comando Territorial de Beja.

Estão ainda previstas as intervenções do Presidente da Câmara Municipal de Barrancos, António Pica Terreno, o Alcaide de Olivia de La Frontera, Juan Torres, do Comandante do Comando Territorial de Beja da GNR, Tenente Coronel Joaquim Figueiredo e António Augusto de Seixas Aguiar em representação da família Seixas.

Nota biográfica:

António Augusto de Seixas Araújo, nasceu em Montalegre (1891) e faleceu em Sines (1958). Fez carreira na Guarda-fiscal, em vários locais do País, do Minho ao Alentejo, com especial destaque para Barrancos onde a sua ação humanista se encontra sobejamente documentada. Em 1936, enquanto oficial da ex-Guarda Fiscal, agindo de acordo com a sua consciência, contra as instruções das autoridades civis e militares portuguesas, protegeu e salvou da perseguição e do massacre das tropas franquistas, um milhar de cidadãos espanhóis que se refugiaram no nosso território, mais concretamente nas
herdades de Russianas e Coitadinha, locais hoje conhecidos por “Campos de Refugiados de Barrancos”.

Nos anos conturbados de 1936 a 1939 da história de Espanha, quando o regime eleito democraticamente é derrubado por militares golpistas, com apoio dos partidos de direita, durante a sangrenta guerra civil, e à medida que as tropas espanholas revoltosas da chamada Coluna da Morte de Yagüe progrediam de sul para norte ao longo da fronteira portuguesa, as populações das localidades ocupadas procuravam refúgio em Portugal, pondo-se a salvo de
sevícias e execuções.

Os primeiros refugiados que afluíram a Barrancos foram os vizinhos de Encinasola, identificados em número de quatrocentos, sendo a primeira vaga constituída principalmente por mulheres e crianças. Segundo a memória local foram acolhidos por várias famílias barranquenhas, com as quais mantinham relações de amizade e de parentesco. Mas também interveio neste processo de hospitalidade o administrador do concelho de Barrancos, que se comprometeu junto do Governador Civil de Beja a alojar temporariamente os vizinhos de Encinasola.

A fronteira de Barrancos era vigiada desde Agosto de 1936 por militares do Regimento de Infantaria 17 de Beja, por forças da Guarda Nacional Republicana, por uma Brigada Móvel da (P.V.D.E) e por militares da Guarda-fiscal. O responsável pelo comando técnico das operações no terreno era o tenente António Augusto de Seixas, comandante do Destacamento Fiscal de Safara. Esta responsabilidade comprova o poder da Guarda Fiscal na fronteira, apesar de contestado por outras organizações militares destacadas para esta “missão”.

Perseguições de toda a ordem desenrolavam-se na zona fronteiriça. Muitos eram mortos antes de passar a fronteira, outros eram detidos pelas autoridades portugueses e deportados para os seus adversários, devido à colaboração do governo de Salazar com os insurrectos fascistas.

Neste contexto, a ação do Tenente Seixas evitou, em 1936, o massacre do milhar de refugiados espanhóis pelas mãos dos seus perseguidores, ou destes em conluio com alguns militares portugueses, tendo organizado, mantido e ocultado um campo de refugiados com centenas de pessoas no lugar da Choça do Sardinheiro nas Russianas e mais de 600 pessoas no Resvaloso, na herdade da Coitadinha, ambas no município de Barrancos, evitando também que vários elementos constantes de “listas negras”, políticos e intelectuais republicanos espanhóis, fossem encaminhados para Badajoz, onde seriam fuzilados.

O Tenente Seixas da Guarda-fiscal era comandante desta região de fronteira e as suas decisões de tolerância e humanidade para com os refugiados desagradavam aos comandos militares destacados para a zona e à polícia política PVDE/PIDE.

Em Outubro de 1936, depois de negociações com o governo republicano de Madrid, Salazar autorizou a repatriamento dos refugiados de Barrancos para a zona republicana de Espanha (Tarragona, Catalunha). Durante o embarque no navio Nyassa, em Lisboa, descobriu-se que o número de refugiados de Barrancos, transportados em camiões até Moura e daqui em comboio até à capital portuguesa, era superior (1020) ao inicialmente declarado (616). A atitude de rebeldia do Tenente Seixas, de proteger e acolher mais refugiados em Russianas e Coitadinha, levou o governo português a acusa-lo de traição, tendo-o punido com prisão de 60 dias no Forte da Graça, em Elvas e à posterior suspensão das funções, com transferência compulsiva para Sines, onde terminou a sua carreira.

Nota biográfica gentilmente cedida pelo município de Barrancos