30 Abril 2023      12:10

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A capa invisível

A capa era invisível, ou seja, ninguém a consegui ver. Tratava-se de uma capa poderosíssima cujo real valor só seria possível determinar se fosse visível. Assim acontece com tantos outros aspetos ou objetos nas nossas vidas. Há coisas que por não serem visíveis, não lhe conseguimos dar o real valor.

Esta capa movimentava-se livremente entre vários lugares, chegando e partindo sem que ninguém se apercebesse. A capa, se falasse, teria muitas histórias para contar. Infelizmente, não era o caso.

Algumas, porém, eram tão marcadas e fortes que o invisível se tornava visível a olho nu. Coisas boas aconteceram por causa da capa invisível. A proteção que ela dava era muito relevante e aqueles abençoados por ela transformavam-se e sentiam-se especiais. Em desastres naturais, a capa protegia os que nela acreditavam.

Certo dia, uma criança perdeu-se no meio do mato. Nesse dia, a capa invisível deitou-se por cima dessa mesma criança, impedindo que o frio lhe deixasse marcas ou a fizesse adormecer sem mais acordar.

Um outro mês, no calor do verão, numa praia sem ninguém, a capa invisível serviu de bóia de salvamento. Tantos outros casos poderiam ser acrescentados a esta lista.

Porém, para toda a panela há um testo, e com a capa invisível não é diferente. Trata-se da obsessão do homem que quer ser o único dono da capa invisível. A sua vontade era maior do que a sua arrogância, já de si aumentada.

Tomou como seu desígnio perseguir até ao fim do mundo essa capa. Mas como se nem a podia ver? Perseguiu meses a fio a ideia de perseguir a capa. Onde quer que pensasse estar a capa, perseguia. Durante todo esse tempo, percorreu todos os continentes, todos os mares. Pensava sempre que no dia seguinte seria o dia em que encontraria a capa. Queria ver o invisível.

Tantos anos fizeram dele um homem mais velho, menos arrogante, prostrado perante a realidade de não alcançar a ganância. O seu grande objetivo ou obsessão demorava a ser cumprido. Agora já não era um jovem cheio de garra, capaz de aprisionar tudo e todos. Agora era um velho decrépito fixado mum objetivo de encontrar uma capa invisível.

No meio de um deserto, o homem já velhinho acreditava que tinha dedicado a vida a encontrar a capa e a mantê-la só para si. Esse mesmo deserto não o conhecia e a capa não era tão grande que o cobrisse todo.

Os dias passaram, a água escasseava e o homem acabou por morrer, sedento, esperando aquilo que nunca alcançaria.

Na hora em que morria, adormeceu e finalmente percebeu que o manto sempre la tinha estado, a proteger a sua busca de um lugar que não conhecia, de uma ambição desmedida.