21 Junho 2018      10:59

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Cidadania e ruralidade

Em tempos idos, onde no Alentejo profundo as dificuldades sociais implicavam um conjunto de comportamentos que aproximavam as suas gentes, factores como a solidariedade e confiança, estimulavam o aparecimento de movimentos cívicos e associativos onde a cooperação e espontaneidade eram indicadores de relevo. No fundo, actos que de forma inata permitiam às populações intervir de forma activa perante os mais variados quadrantes da vida política, cultural e social do seu território.

Hoje, e fruto de transformações sociais e orgânicas, hábitos, valores e formas de estar diferentes, a realidade do Alentejo não foge ao cenário do país. Aceito que a desertificação seja um factor de extrema importância no desaparecimento do próprio associativismo, mas não posso concordar que seja o principal factor que implique o afastamento das populações em relação à forma pouco participativa na vida política e cultural, antes pelo contrário, será a desertificação uma janela de oportunidade para os que persistentemente ficam, lutam e zelam pela melhoria dos seus sítios e lugares. Parece-me todavia, que estamos perante um comportamento cultural e social padrão ao qual Coimbra de Matos refere em 2012 em entrevista: “Somos inseguros, imaturos, praticantes da transgressão na sombra, além de desorganizados, individualistas, garbosos, disponíveis. Nós, os portugueses, o que esperamos do chefe, do pai, do protector, é que decida por nós, que assuma a responsabilidade por nós, que saiba sempre a resposta”. Obviamente que esta falta generalizada de participação cívica, terá também as suas raízes num conjunto de factores aos quais não sentimos confiança, segurança e respeito, como é o caso do descrédito na própria classe política, entre outros.

E é precisamente neste quadrante que foco a minha opinião: na envolvência que o poder político terá que, não só demonstrar, como efetivar, no sentido de conseguir envolver os cidadãos, como sensibilizar o interesse pela cidadania, principalmente entre os jovens. Não sendo um processo fácil, é indispensável mudar este cenário cultural! Como referi anteriormente a propósito da desertificação, o facto de estarmos perante um cenário de crise, pode e deve implicar uma nova forma de pensar, de viver, sendo favorável ao aparecimento de novos modelos de participação e intervenção cívica.

Em sentido inverso, e para além de tantas outras iniciativas, o Orçamento Participativo Portugal (OPP) tem-nos demonstrado que o cenário na nossa região começa a dar indicadores de mudança. Com um carácter de aproximação dos cidadãos a financiamentos, o OPP, estimula por si só a ligação entre território e populações, ou seja, a sensibilização e incentivo, projectando novas posturas de pró-actividade e criatividade para com os mais variados meios locais. No fundo, nós Alentejanos temos uma grande oportunidade de mostrar a nossa capacidade de intervenção, de sermos mais e melhores participantes com vista ao poder de decisão na utilização de verbas públicas. Sob votação, são já inúmeras as propostas nas mais variadas temáticas: Cultura, Educação, Ciência, Agricultura, Turismo entre outras.

No meio rural, onde os recursos, mecanismos e instrumentos disponíveis escasseiam é no segmento mais jovem que reside a semente do progresso. Na sua determinação, vontade, envolvência e intervenção cívica para com o seu território, poderá estar o futuro de gerações, onde o isolamento pode ser combatido com novas e boas práticas de cidadania e associativismo!