11 Agosto 2014      01:00

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Europa : liderança tetracéfala desajustada

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A principal epidemia que corrói a Europa desde os seus primórdios é a da liderança. O emaranhado decisório de onde emanam as decisões procura nos cidadãos sentimentos de confusão e desinteresse, que são, a posteriori, mensuráveis no sentimento de estranheza face à liderança. Ora, como o principal bastião da identidade é o sentimento de pertença a um grupo de características uniformes representado por uma cúpula respeitada e apoiada, a cidadania europeia não passa, por hora, de letra morta nos tratados.

Quanto à questão da liderança, cabe ao leitor o exercício nada evidente de identificar o líder da União Europeia entre a comissão Europeia, o Parlamento Europeu e os Conselhos: o Europeu e o de ministros. A Comissão Europeia representa na tríade o embrião do executivo europeu, porém surge neste esquema institucional diminuída face à disputa pelo poder entre o parlamento europeu e os conselhos. Cabe-lhe o monopólio da iniciativa legislativa, que faz dela o motor por excelência da União.

O Parlamento Europeu constitui, certamente, o protagonista da construção europeia pelos poderes que adquiriu, mas também pelo modo de eleição. O papel que ele encarna no esquema institucional determina o rumo da União Europeia. A eleição direta pelos Cidadãos europeus e o envolvimento major deste no processo decisório empurraram, ao longo destes anos, a União Europeia para um modo de federalismo sui generis.  

Já o conselho de Ministros e o conselho Europeu representam não a Europa dos cidadãos, mas a Europa dos Estados. O conselho de ministros é a principal instância decisória da União e reúne ao nível ministerial os representantes dos Estados-Membros. Constitui o contrapeso do Parlamento Europeu no conhecido procedimento de codecisão, embora a sua legitimidade advenha dos estados-membros e não dos cidadãos como no caso do Parlamento Europeu.

Já o conselho europeu é a instituição que reúne ao mais alto nível os chefes de Estado e de Governo de todos os Estados Membros. As grandes decisões do futuro da União germinam nesta estrutura, bem como as linhas mestras da construção europeia. Ao longo da história o conselho europeu tem sido o responsável pelos numerosos impasses da construção europeia, embora, noutras tantas ocasiões, tenha sido a pedra de toque dos passos consentidos a favor do federalismo europeu. Somente no seu seio o modo de decisão peca por falta de transparência e de equidade. As mais das vezes, os desígnios da União ficam entregues aos Estados-membros mais poderosos, em detrimento dos pequenos, amordaçados e manietados face à demonstração de poder dos grandes.  

Se o esquema, por si só, já parece complexo acresce que na União existe o medo declarado de utilizar o léxico conhecido de todos, de tal forma que ainda parece pouco tangível a divisão de poderes enunciada outrora por Montesquieu. Quem são afinal os detentores dos poderes executivo, legislativo e jurisdicional na Europa?

 

Imagem: Union Européenne, Dessins de Kroll, Courier International, N.º 1026