15 Julho 2021      11:21

Está aqui

Virgem Suta: tocar no Alentejo é “tocar em casa”

Os Virgem Suta, dupla alentejana composta por Jorge Benvinda e Nuno Figueiredo, está de regresso aos palcos numa digressão de concertos gratuitos um pouco por todo o país. A viver em Beja, claro que os artistas não deixaram o Alentejo de fora desta tour nacional.

Os próximos concertos passam por Moura, no dia 20 de julho; por Vidigueira, no dia 30 de julho; Alvito, no dia 12 de agosto; Mértola no dia 19 de agosto; e Almodôvar no dia 27 de agosto. A 7 de dezembro, é a vez de Cuba receber esta dupla.

Este jornal esteve à conversa com um dos membros da dupla, Nuno Figueiredo, que nos contou tudo sobre a sua passagem e vivência pelas terras alentejanas.

 

Como nasceram os Virgem Suta?

Nasceram por mero acaso, porque eu, não sendo de Beja, fui morar para Beja quando fui estudar. Ou melhor, calhei em Beja também por mero acaso, e conheci o Jorge ao fim de algum tempo, e ambos fazíamos música embora em separado, em grupos diferentes. Com o tempo conhecemo-nos, fomos fazendo música juntos, começamos a fazer maquetes, gravações, começamos a ter bandas juntos e, ao fim de uma série de anos, formamos aquilo que viria a ser os Virgem Suta. Depois fomos a um festival de música os dois juntos, conhecemos o produtor do primeiro disco, Hélder Gonçalves, dos Clã, e pronto, a carreira começa aí.

Mas quando começa a carreira discográfica já tínhamos uma dezena de anos em que tivemos bandas e partilhávamos ideias comuns, sei lá… é uma ligação que já tem mais de 20 anos. E desde aí gravámos mais dois discos, e estamos a gravar o quarto, que há de sair para o ano.

 

O Jorge é natural de Beja, o Nuno veio viver para Beja. O Alentejo tem servido de inspiração para a vossa música?

Sim, claro. É o sítio onde vivemos e é o sítio que nos vai apresentando motivos para escrever. As histórias têm sempre alguma coisa a ver com aquilo que nós vamos vivendo ou vemos acontecer à nossa volta, e como cá vivemos, obviamente que são histórias de cá. De uma forma geral, podem-se generalizar, mas o que é certo é que o cenário que nos serve de base para estas histórias normalmente é sempre o nosso quotidiano.

 

Como descrevem a vossa música?

É música portuguesa, com influências da música pop, do rock, da música popular, também. E sempre que possível tem alguns elementos do quotidiano: se pudermos gravar com uns tachos e umas panelas no meio das canções… Colocamos sempre alguma coisa assim mais fora do comum. De alguma maneira, a forma como fazemos a música é sempre muito rudimentar e procuramos que seja assim, pelo menos no início, na base. Partindo das ideias de um e de outro, tentamos arranjar soluções que vamos somando, mas a base é sempre muito com o que temos à mão e, portanto, é uma música simples, portuguesa, que fala do nosso quotidiano e do que é ser português.

 

E se calhar por isso mesmo tanta gente se identifica.

Espero bem que sim (risos). As pessoas de alguma forma têm sempre uma canção que lhes toca porque se reveem na forma como nós descrevemos as histórias. E normalmente as canções têm sempre uma história e nós gostamos de contar histórias, e então é normal que as pessoas se identifiquem com uma ou outra, pelo menos.

 

Como tem corrido esta digressão?

Tem sido muito divertido. Ainda no domingo estivemos em Barrancos e no dia anterior tínhamos vindo de Torres Novas. Já fomos a Castro Verde, a Mértola, Aljustrel, Moura, Vidigueira… Estamos a fazer uma série de datas por vários sítios e está a ser muito divertido, para já porque os concertos têm todos um formato mais pequenino e isso liga-nos mais ao público, estamos mais próximos. E depois porque também estamos a tocar após um interregno gigante. E tanto para nós como para as pessoas parece já estranho: o espetáculo já parece uma coisa estranha. Mas ao mesmo tempo sentimos uma vontade, quer nossa, de começar a tocar, de mostrar o trabalho outra vez, quer das pessoas, de ver, de estar num sítio onde já não estavam há muito tempo. Tem sido uma experiência interessante, apesar das máscaras, que é sempre uma coisa esquisita, uma pessoa não conseguir ver a cara das pessoas. Mas tem sido uma aventura bem fixe, e parece que estamos a começar de novo – isso tem sido, até mesmo para a banda, uma fonte de energia extra que não estávamos à espera.

 

Como é tocar no Alentejo?

É bom, é tocar em casa. É tocar para quem nos quer bem. Para já, é muito bom saber que as pessoas se identificam connosco, e que nós também gostamos de levar essa bandeira quando vamos tocar fora daqui. Somos uma banda alentejana com muito gosto. E, portanto, é passar de sala em sala de amigos, basicamente. É estar a tocar com pessoas que gostam de nós e para pessoas que gostam de nós, portanto é bom. Têm sido serões bem divertidos e vão continuar a ser, certamente, porque sentimo-nos bem, sentimo-nos em casa.

 

De todas as vossas visitas ao Alentejo, qual a favorita?

O Alentejo tem tanto em comum com todo o lado e também de diferente. Acho que estava a ser injusto se escolhesse uma ou outra, porque em cada sítio encontram-se coisas que são únicas e especiais. Lembro-me ainda, por exemplo, no domingo, em Barrancos: eu nunca tinha ido lá, e foi incrível. Adorei conhecer. Eu gosto muito de ir aos locais e andar um bocadinho por lá, conhecer as pessoas, a forma de estar. E apesar de haver tanta coisa que nos une, há também muitas particularidades de cada um dos sítios. Todos eles são bonitos, é muito bom estar, e come-se muito bem, as pessoas são simpáticas, seria injusto escolher uma.

 

O Nuno é do Porto, mas antes de vir para Beja já conhecia o Alentejo?

Conhecia só de passagem, verdade seja dita. Conhecia muito pouco, e quando cheguei, confesso que foi muito estranho de início. A ideia que eu tenho é que não podia cá ficar e depois acabei por ficar, e adoro, não troco. Era muito diferente. Estamos a falar de 1990 e qualquer coisa, e Beja era uma cidade diferente. Mas depois fiquei agarrado ao fim de um mês. Tanto que eu consegui transferência e desisti, porque comecei mesmo a gostar de cá estar. E já não sou capaz de trocar, porque gosto de tudo: gosto deste modo de estar, gosto da forma como as pessoas vivem, da forma como as pessoas partilham o seu dia-a-dia. Já não me habituaria a viver numa cidade grande. Não sei explicar o que é que prende, mas que há qualquer coisa que prende, lá isso há. Adoro o Alentejo, gosto mesmo de estar aqui. Só falta um bocadinho de mar (risos).

 

Então veio para ficar e já não se vê no Porto.

Não, só de passagem. Gosto muito de lá ir, gosto muito de lá estar, mas prefiro o clima daqui. E gosto mais do modo de estar das pessoas de cá. Gosto muito mais de viver com alguma calma (que quem está de fora vê com algum desdém), mas eu acho que é inveja (risos). Eu gosto muito de usufruir deste modo de estar, mais calmo, e não correr atrás da cenoura. Parece que vivemos num mundo em que andamos sempre atrás da cenoura, tipo o burro atrás da cenoura, e na verdade corremos para o fim, porque quando se corre muito quer-se chegar ao fim, e o fim é aquele sítio onde ninguém quer chegar, que é a morte. Portanto, eu gosto mais de andar mais lento, ir vendo as coisas com mais calma, e vivendo com mais vagar, como se diz aqui.

 

E se pudesse escolher uma música que gosta mais de tocar ao vivo, e uma música que caracterizasse mais o Alentejo, qual seria?

A “Dança de Balcão”. Acho que é uma música que, quando a escrevi, foi exatamente inspirada neste modo de estar. O brinde às pessoas de quem gostamos, a partilha, a ideia de estar com quem gostamos – acho que o Alentejo é muito isso. O Alentejo fomenta muito esta partilha, o convívio com as pessoas de quem gostamos, e acho que essa música é que caracteriza muito bem não só o modo de estar, como também a paisagem do Alentejo. É uma música calma, agradável e simpática, que é aquilo que o povo de cá é.