1 Outubro 2022      11:19

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A profecia das três bolotas

No ano longínquo de 2198, após anos e anos de guerras nucleares e devastações naturais, cansadas por tudo o que é menos natural e menos humano. Foram anos seguidos de devastação. Portugal tinha deixado de existir e de ser conhecido como tal. Nas grandes cidades restavam escombros e cinza. Não crescia nada nelas. Além do castanho e do cinzento, nada mais havia.

Ninguém se lembrava das cores do mundo, das cores da natureza. Ninguém existia para se lembrar das cores, ou na vida em si.

Sei. Pode parecer uma história futurista como tantas outras. É. Passa-se no futuro distante que nenhum de nós pode antever como seria.

Se Portugal não existia já, também o Alentejo era memória, se a houvesse, do passado.

Em 2022, porém, alguém escrevera algo sobre o futuro. Não era algo preciso. Uma profecia vaga que dizia alguma coisa que podia significar qualquer coisa, dependendo de quem a lesse e dependendo de quem a quisesse utilizar na sua interpretação.

Nesse mesmo ano, escreveu que o mundo mudaria e se tornaria um lugar inóspito, causado pela cegueira humana. Toda a natureza e o ser humano seriam quase levados ao ponto de extinção. Passaram, como tantos realizaram em filmes e outros inscreveram em livros, os seres humanos a viver debaixo do solo, pois acima dele nada mais havia que pudesse oferecer alimento.

Só a vida regressaria à terra, dizia a profecia, quando no pleno da devastação, alimentado por uma gota de água que teimava em não cair, nascesse uma azinheira, fruto de uma semente, e dessa pequena árvore, nascessem três bolotas. Essas mesmas bolotas seriam a promessa de futuro. Assim tudo se replicaria. Os homens debaixo do chão assim o esperavam.

A azinheira havia de nascer, dizia a profecia, ainda que pequena, mas seria a mãe de todas as que já haviam desaparecido.

Ninguém conhecia em 2022 o poder de três bolotas. Não seria possível saber como de uma imensidão de árvores e de natureza se poderia chegar a um vazio completo.

Em 2198 ninguém conhecia o Alentejo, nem tinha ideia do que já tinha sido no passado. Sabiam que havia um planeta sustentável e queriam voltar a conhecê-lo. Um dia, diziam, quando as três bolotas surgirem. Um dia, quando a humanidade voltar a olhar para si.