16 Setembro 2018      12:27

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O dia do indizível

Duas canções, um trecho de poesia de Aberto Caeiro e o dia do indizível (a tomada de posse de Donald Trump como presidente dos EUA) – relembrando o pesadelo.

Duas canções que não salvam nem confortam, mas que são incrivelmente belas; ficam como aviso:

Breathing (Kate Bush)     

Closing Time (Leonard Cohen)

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Por fim o corpo vai acordar para o pesadelo. A mente anda por lá há algum tempo – que a razão mede em meses, que o desejo sofrido pela dormência sonhava infinito (antes assim!). Mas quanto ao corpo, enfim, para esse todo que a biologia pretende evolutivo o dia chegou. Inescapável, pois claro. O dia em que um acto de posse valida de vez o que antes largos milhões de miseráveis empobrecidos (oh, vacuidade infinita, cérebros feitos de espaços em branco, galáxias inconquistáveis e impenetráveis de coisa nenhuma!) validaram, com alguns homens bons a assistir.

Quanto a mim, não valido, não aceito, não normalizo, limito-me a assistir em lágrimas. Choro de raiva e depois sento-me em sofrida aceitação – temo então resignar-me e choro como se gritasse. É grito, pois vem seco e desesperado. De nada serve. Olho para os múltiplos livros à minha volta. O meu bunker. O meu covil. Existe mesmo um mundo lá fora? Talvez não…

Num certo momento, a meio de nada, vou à janela e espreito. O Sol brilha, magnífico, senhor de si. Luxos que pertencem apenas aos deuses. Que fazer? Folheio um livro escolhido ao acaso… Tão equilibrado quanto é possível permanecer nas asas de um vento inesperadamente fresco, querendo planar, leio: “Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol. Ambos existem; cada como é.” O bom do Alberto Caeiro – quem mais?! Mas este dia não é como os outros. No que me diz respeito, nem sol nem Alberto, nada me pode resgatar.

O que resta, então? Coisa pouca – apenas a minha tristeza infinita.

 

Imagem de nbc.na

 

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