24 Novembro 2019      00:34

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Nos domínios da loucura… perdão, da perfeição.

John McEnroe – No Domínio da Perfeição (2018), Julien Faraut –

Por vezes, de um ponto dinâmico que a memória, na sua imprevisibilidade, já esqueceu, vemos surgir a obra-prima. Não nos elementos (porventura) esperados da criatividade primordial, mas na sua recriação, na remistura desses elementos. O sublime reinventado, pois ao contrário do que se diz por aí, não está tudo inventado (a reinvenção não é menos invenção). O cruzamento e o reajuste são, neste sentido, o verdadeiro potencial desta pós-modernidade convencida de si – e na perspectiva do sujeito voluntariamente agrilhoado, não importa o grau de leviandade associado, com alguma razão.

Para o caso, John McEnroe e a final de Roland Garros, em 1984, utilizando imagens capturadas em 16 mm para um filme anterior como ponto de partida. Revivescências de material em bruto a desesperar por um novo olhar. Ou estamos a ser injustos? …

Corra-se o risco.

O ténis na, digamos, incomum qualidade de meio-ambiente – Espaço rectilíneo onde uma alma (por força) contraditória, (de preferência) no limite visível da ruptura, vacila entre conceitos abstractos, mas que, pela impossibilidade da mentira (É DESPORTO, NÃO CINEMA!), só encontram contraponto na comoção do corpo e da acção directa deste sobre a matéria disponível.

Sim, ‘perfeição’ e ‘estratégia’ são palavras que se lhe ajustam, todavia num court de ténis não jogam em simultâneo para os dois jogadores, uma vez que alguém vai perder no fim. E ganhar exclui o total, uma vez que ninguém venceu nem vencerá todos os jogos.

Fica o caminho, no entanto, a solidão, o instinto assassino como puro reflexo (i.e., a disfunção), a perplexidade (a redundar na perspectiva ilusória do controlo) … Percurso em que a comédia se ajusta perfeitamente à tragédia sem a muleta do cinismo. A humanização do melhor jogador do mundo à época com a eficiência da incisão maquinal sem perder de vista a especificidade, algo que se pensava inexequível.

Em suma: eis um filme que faz todo o sentido hoje, tanto quanto o fará, sejamos optimistas, no ano 12.000. O seu timing é o instante do sapiens sapiens. 

 

Imagem de vogue.com