8 Dezembro 2018      15:17

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A Lage

Reza a lenda que, num sítio muito distante, numa aldeia perdida do meio da Serra do Caldeirão, concelho de Almodôvar, freguesia de São Barnabé. A aldeia chamava-se Cerro da Ursa. Nessa aldeia, vivia um homem. Este homem levava uma vida simples. Cuidava de um pequeno rebanho e tratava das suas hortas. Nos montes ao lado viviam outras pessoas, mas é dele que reza a lenda. Não sei o nome do homem, sei só como ocupava os seus dias.

Levava este homem uma vida calma e pacata até que uma noite, em certa data perdida no tempo, começou a ter sonhos estranhos. O homem não conseguia mais descansar como antigamente. Um sonho apoderou-se dele e regressava incessantemente, todas as noites. Mal o homem fechava os olhos, começava a ouvir uma voz que lhe repetia a seguinte frase: Vai a Santarém que lá está o teu bem. E, durante toda a noite, o homem ouvia esta frase que ecoava dentro da sua cabeça. Nada mais, só as palavras: Vai a Santarém que lá está o teu bem. E o som ecoava, cada vez mais forte.

Passaram-se muitos meses com o homem a lutar contra a voz que, dentro da sua cabeça lhe ecoava e lhe dizia que fosse a Santarém em busca do seu bem. Meses depois, chegou a altura em que o homem não conseguia já pensar mais. Já não descansava noite nenhuma. A voz ecoava e o homem tomou uma decisão. Iria pôr-se a caminho e iria a Santarém, à procura do seu bem. Agarrou no macho e, taleigo recheado com pão, azeitonas, presunto e chouriço, abalou.

Levou dois dias no caminho, atravessando todo o Alentejo, vendo a diversidade desta terra e pernoitando onde calhava. Ao terceiro dia, lá chegou a Santarém, em dia de feira. Meio perdido, o homem lá se sentou debaixo de uma árvore a comer uma bucha até que um homem, vendo aquele que parecia meio perdido, se aproximou dele e lhe perguntou o que ali fazia. O homem olhou-o e, triste por não ter encontrado nada ainda, lamentou-se dizendo:

- Oh homem, sonho todos os dias com as mesmas palavras, que me dizem – Vai a Santarém que lá está o teu bem. Muito sonhei com isto que, não havendo nada mais a fazer, me pus a caminho e vim até esta terra onde não conheço ninguém e aqui estou, perdido, antes de abalar de volta para casa, sem nada.

Responde-lhe o homem de Santarém: - Ah meu amigo, não se deixe levar por esses sonhos. Eu todos os dias há anos que tenho o mesmo sonho e não ligo nada a isso. O meu sonho diz-me que num monte longe de tudo, chamado Cerro da Ursa, há um curral de cabras e, nesse curral, está uma laje tão grande que é difícil um só homem levantá-la. Em cima dessa laje dorme um chibate, com cornos que quase alcançam o céu. Debaixo dessa laje, vejo um pote cheio de libras de ouro. Esta imagem acompanha-me há anos, mas nunca me passou pela cabeça em lá ir. Nem saberia como chegar.

O homem ouviu o relato do outro e, na sua cabeça um sorriso surgiu. O seu bem tinha chegado. Era no monte onde vivia, no seu curral, no lugar onde o seu chibate dormia que poderia estar o seu bem, um pote de libras em ouro. Não sabia se era verdade, mas a possibilidade deixava-o contente acima de tudo. Abalaria de Santarém nessa mesma hora, em direção ao lugar que o tinha visto nascer. Dois dias levou na viagem e, quando chegou ao monte, à noite, sem nada dizer à mulher, deixou que todos dormissem e, nessa mesma hora, foi ao curral e sem fazer barulho afastou o chibate e começou a escavar em redor da laje até chegar a um som metálico. A cara do homem alegrou-se e escavou mais depressa. Lá, debaixo da laje, estava um pote, fechado, e dentro, libras de ouro reluzente como nunca tinha visto.

O sonho do homem tinha-se cumprido e todo o bem estava, afinal, no seu próprio lugar, onde passava todos os dias. Sem anunciar, foi usando as libras para melhorar a sua vida e, com isso, criou os filhos e viveu desafogado com a mulher. Na sua casa, o pote continua ainda escondido, debaixo da lareira, onde ninguém o encontraria. Assim aconteceu.     

 

 

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