19 Fevereiro 2016      16:23

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JORGE DA CONCEIÇÃO, O HERDEIRO DOS BONECOS DE ESTREMOZ

Jorge da Conceição é o autor de inúmeras figuras modeladas à mão em barro vermelho, nas quais utiliza as técnicas e os materiais utilizados nos “Bonecos de Estremoz”. Descendente de uma família de ceramistas conceituada de Estremoz, Jorge da Conceição entregou-se a tempo inteiro a esta atividade após 25 anos afastado da cerâmica. Conheça mais sobre a sua atividade em https://www.facebook.com/jorgeconceicaoceramics/

Tribuna Alentejo – Fale-nos do Mestre Mariano da Conceição e de forma influenciou o seu percurso e o seu gosto pela cerâmica.

Jorge da Conceição – Mestre Mariano da Conceição foi o meu avô materno e foi ele que na década de 30 do século passado, em conjunto com o escultor Sá Lemos (na altura diretor da Escola de Artes e Ofícios de Estremoz onde o meu avô lecionava) relançou a produção de bonecos de Estremoz, nessa época quase perdida. O grande impulso aconteceu com a sua participação, em 1940, na Exposição do Mundo Português em Lisboa, onde a minha avó Liberdade pintava as peças que o meu avô lhe mandava de Estremoz. O meu avô faleceu antes de eu nascer e foi a minha avó, que continuou a produção de bonecos, que mais me influenciou nesta arte.

Tribuna Alentejo – Também a sua mãe foi uma das principais ceramistas que produziu figuras de Estremoz e que mais contribuiu para a sua divulgação. Como foi crescer em Estremoz e rodeado pelos “seus bonecos”?

Jorge da Conceição – Realmente pode-se dizer que cresci rodeado de bonecos e a ver a sua manufactura, não apenas pela minha avó Liberdade mas também pela minha tia Sabina Santos (irmã do meu avô Mariano) e pela minha mãe, Maria Luisa, que desde muito nova também trabalhou nesta arte. Sempre tive uma paixão pelo barro e como “o miúdo tinha jeito” a verdade é que todos me incentivavam para fazer mais. Tenho peças feitas por mim desde os meus 5 – 6 anos de idade. A minha mãe acompanhou-me muito nesta decisão de voltar à cerâmica e foi determinante no apoio que me deu.

Tribuna Alentejo – Por que acabou por optar por uma área profissional tão diferente e por se afastar, consequentemente, da cerâmica?

Jorge da Conceição – Quando era novo e tive que escolher um curso superior vacilei entre Belas Artes e Engenharia, sempre tive essas duas paixões, acabei por ir para o Instituto Superior Técnico, onde me licenciei em Engenharia Electrotécnica e de Computadores, as artes ficaram adiadas, foi uma porta que fechei na altura mas que sempre tive esperança de um dia poder voltar a abrir... Após o curso iniciei-me na consultoria numa grande multinacional e o envolvimento foi tal que fiz aí toda uma carreira durante 25 anos.

Tribuna Alentejo – Como foi voltar à criação destas figuras, passados 25 anos?

Jorge da Conceição – Acho que sempre pensei que ia ser mais fácil, mas depois de tanto tempo sem pegar no barro parecia que as peças não me saiam... estive uns meses largos a treinar antes de querer mostrar as minhas peças. Está a ser uma experiência muito rica, é uma sensação muito boa a de criar peças novas, de as fazer “aparecer” de uma bola de barro... É uma experiência profissional muito diferente da que tive anteriormente e, talvez por isso, muito enriquecedora. É como se estivesse a desenvolver uma segunda vida profissional, a fazer toda uma aprendizagem e uma carreira, partindo de quase nada... é muito bom.

Tribuna Alentejo – Imagens de Santo António, de Nossa Senhora, imagens da vida e paixão de Cristo, figuras alegóricas, ofícios rurais… Do seu portefólio fazem parte inúmeras peças. Em que locais se encontram expostas e à venda?

Jorge da Conceição – Anualmente participo na FIA (Feira Internacional de Artesanato da FIL), onde exponho os meus trabalhos, e tenho o meu atelier em Lisboa onde trabalho. Participo também regularmente em exposições e tenho peças em algumas casas da especialidade.

Tribuna Alentejo – O que significou para si e para a Ceramics by Jorge da Conceição ter sido galardoado com o 1ª Prémio no concurso de Artesanato Tradicional na Feira Internacional de Artesanato de Lisboa?

Jorge da Conceição – Foi muito importante ter recebido essa distinção dois anos apenas após ter iniciado esta minha atividade. É um reconhecimento do investimento que estou a fazer e que me deu muito ânimo para continuar. Fiquei muito contente e surpreendido uma vez que receber o prémio foi, de facto, inesperado.

Tribuna Alentejo – Costuma ir a Estremoz?

Jorge da Conceição – Vou com frequência. Tenho lá casa e tento participar em todas as iniciativas e exposições que o Museu Municipal de Estremoz leva a cabo relacionadas com a barristica de Estremoz.

Tribuna Alentejo – Até onde o Alentejo já viajou através das figuras que cria?

Jorge da Conceição – A verdade é que não sei, sei que há peças minhas em Espanha e noutros países, como por exemplo o Canadá, mas não consigo ter um registo integral de até onde as minhas peças já viajaram...

 

Tribuna Alentejo – Que figura ainda não criou e gostaria de criar?

Jorge da Conceição – Tantas! A verdade é que as temáticas que trabalho, religiosas, relacionadas com o nosso Alentejo e outras, têm um potencial inesgotável...