18 Julho 2019      12:09

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Hoje é dia de um dos maiores de sempre: Mandela

Hoje, 18 de julho, é o Dia Internacional Nelson Mandela. Mais, hoje celebrava-se o aniversário de “Madiba”. Mais ainda, celebra-se o seu 101º aniversário.

Quando, em 2003, Mandela faleceu, foi relembrada uma frase sua de uns anos antes. “A morte é inevitável. Quando um homem fez o que considera seu dever para com seu povo e seu país, pode descansar em paz. Acredito ter feito esse esforço, e é por isso, então, que dormirei pela eternidade.”

Nascido a 18 de julho de 1918, em Mvezo, Mandela viria a ser um nome que viria a marcar a Humanidade. Mais conhecido por Nelson – nome dado pela professora no primeiro dia de aulas na escola primária – era Rolihlahla o seu nome original – foi escolha do seu pai e tem o significado, em Xhosa, de agitador, o «que traz problemas»; e era também chamado muitas vezes por “Madiba” – um nome usado por quem o seu clã nutre carinho e respeito.

Mandela – um de treze filhos - era de nobreza tribal e, na infância, recebeu a educação pela via oral e exemplo dos anciãos até aos 7 anos, quando foi para a escola primária. Aos 9, o seu pai faleceu, o que fez com que Mandela tivesse que trocar de vila, sendo o regente do povo Tembu, Jongintaba Dalindyebo, a responsabilizar-se pela sua educação e que o fez entrar na escola preparatória Clarkebury Boarding Institute - um colégio exclusivo para alunos negros da elite e que era dirigido por um reverendo branco, o diretor Harris, o primeiro branco a quem Mandela apertou a mão.

Este colégio viria a ser também decisivo para Mandela, uma vez que foi aqui que ganhou uma visão mais ampla do mundo, antes de entrar em 1939, Mandela em Fort Hare - a primeira universidade da África do Sul a ministrar cursos para negros.

Só existiam 150 alunos e isto ajudou a que esta universidade tivesse sido como que uma incubadora de líderes revolucionários e, no segundo ano, em protesto contra o reitor da Universidade, Mandela saiu e regressou a Mqhekezweni, onde poderia ter assumido o seu lugar de chefe tribal, não tivesse fugido – aos 23 anos – de um casamento arranjado pelo rei Jongintaba; um episódio com que Mandela chegou a brincar dizendo que se não tivesse fugido "...hoje seria um chefe muito respeitado, sabe? Teria uma barriga bem grande, muitas vacas e carneiros.”

Fugido da aldeia, foi então que que foi para a capital, Joanesburgo, onde viria por iniciar a atuação política e a tomar consciência do real abismo de direitos e deveres que separava brancos e negros no país. Foi este o dínamo na sua luta contra o racismo.

Tornou-se advogado e líder da resistência não-violenta da juventude, onde começou por participar informalmente de reuniões do Congresso Nacional Africano (CNA). Em 1944, casou-se com Evelyn Mase, a primeira das suas três mulheres, e, com Sisulu e Tambo, fundou a liga juvenil do CNA, a ANCYL e que pretendia mudar a postura subserviente do partido face aos brancos. Chocaram o sistema ao lançar o manifesto "Um homem, um voto" - onde denunciaram que 2 milhões de brancos dominavam 8 milhões de negros e detinham 87% do território.

Mandela começa a tornar-se cada vez mais popular e os movimentos de libertação nos quais estava envolvido pareciam estar a ter um crescente.

No entanto, a vitória nas eleições presidenciais Partido Nacional (Nasionale Party, em africâner), um partido dominado pelos brancos de origem europeia, foi um rude golpe. Nascia o Apartheid (significa em africâner “condição de não fazer parte de algo” - um dos regimes mais violentos e simbólicos do segregacionismo e racismo do século XX – e uma das medidas foi a tomada de terras de negros, mestiços e indianos; num claro exemplo desta ação, mais de cinquenta mil negros moravam em Sophiatown, Joanesburgo, e foram todos desalojados.

Por protestar e manifestar-se contra o Apartheid, em 1956, Mandela é preso, em frente da mulher e dos filhos. Foram presas mais 144 pessoas no mesmo dia, já Mandela era um advogado bem-sucedido e um “bon vivant”, frequentando restaurantes e deslocando-se num carro americano importado.

Casou então pela segunda vez com Winnie, e nesta altura já Mandela entrara para a clandestinidade, numa altura em que os confrontos subiam de tom e o princípio da não-violência acabaria por terminar em 1960, quando o líder do CNA, o chefe Luthuli autoriza Mandela a levar a cabo a constituição de um movimento de resistência pelas armas o “Umkhonto we Sizwe” – "Lança de uma Nação" - também conhecido pela sigla "MK", o braço armado do CNA, mas que Mandela queria que fosse uma força militar totalmente subordinada a um órgão político central; o treino militar seria paralelo ao político, de forma a ficar bem definido que a revolução servia para tomar o poder, e não para habilitar militares.

Quando em 1960, um movimento opositor do Congresso Pan-Africano organizou um protesto pacífico para queimar os livros que impediam a entrada de negros em áreas do distrito de Sharpeville - a manifestação foi reprimida pela polícia e tornou-se num violento confronto, tendo as forças de segurança aberto fogo contra a multidão negra. Morreram 69 pessoas e 178 ficaram feridas.

Passados uns dias, o Estado de Emergência é decretado pelo governo; em resultado disso, Mandela e outros revoltosos presos e o CNA foi proibido.

Após várias prisões e condenações, um tribunal decidiu condenar Mandela à prisão perpétua por sabotagem e por conspiração para promover uma invasão externa da África do Sul.

Nesse julgamento, declarou-se inocente das acusações, mas confessou-se culpado por lutar pelos direitos humanos, pela liberdade, por atacar leis injustas e por defender o seu povo, tendo falado por quatro horas, e tendo concluído do seguinte modo: "Durante a minha vida, dediquei-me a essa luta do povo africano. Lutei contra o domínio branco, lutei contra o domínio negro. Acalentei o ideal de uma sociedade livre e democrática, na qual as pessoas vivem juntas em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal para o qual espero viver e realizar. Mas, se for preciso, é um ideal pelo qual estou disposto a morrer."

Com o número 46664, Mandela viria a passar 27 anos na prisão. Em Robben Island a sua cela tinha dimensões reduzidas: de 2,5 metros por 2,1 metros e uma pequena janela de 30 cm e estava privado das informações do mundo exterior, pois não eram permitidos jornais. 

Em 1976, o Soweto revoltou-se e a rebelião resultou numa feroz repressão com centenas de mortos.

A comunidade internacional despertava para o assunto e, mesmo estando preso, Mandela foi homenageado pelo mundo fora: em 1983 recebe o doutoramento em Direito pelo seu "compromisso altruísta para com os princípios de liberdade e justiça" pelo City College de Nova Iorque e, no mesmo ano, é feito cidadão honorário da cidade grega de Olímpia.

Fora da prisão, em 1985, o CNA empreendeu uma campanha para tornar o país ingovernável; o presidente Botha chegou a declarar ao seu povo que precisavam "adaptar-se ou morrer".  No mesmo ano, Mandela foi operado à próstata num hospital fora da prisão. Quando voltou, foi-lhe noticiado que não voltaria para a sua cela comum, e ficaria isolado dos demais. Mandela não protestou e aproveitou esse facto para fazer algo com que os seus companheiros de luta não iriam estar de acordo: negociar com o governo; iria agir por conta própria, sem consultar ninguém: escreveu ao ministro da Justiça, Kobie Coetsee, informando-o da sua posição e disponibilidade. A resposta chegou um ano depois, com uma oferta de liberdade condicional proposta pelo presidente Botha - em troca, Mandela tinha que prometer não incentivar a luta armada na África do Sul. Recusou.

As eleições entre os brancos sul-africanos de 1987 voltaram a dar – massivamente - o poder ao Partido Nacional: 82% do eleitorado. Mesmo com este resultado, o governo de Botha continua a negociar com Mandela e foi levado para fora da prisão para realizar uma viagem pelo país, num carro blindado, para que o conhecesse duas décadas depois de encarcerado. Ninguém o reconhecia; a sua última foto publicada datava de 1962.

Em 1989, Botha recebe Mandela em sua casa e acabaram por descobrir que tinham ambos muito em comum. Com o estado de saúde de Botha a piorar, seria Frederik de Klerk a assumir as negociações com Mandela - que o considerava “o mais sério e honesto dos líderes brancos” com quem ele tinha negociado.

Após uma forte campanha internacional, a 11 de fevereiro de 1990, Mandela é finalmente libertado e é histórica a sua imagem de punho no ar. "Quando me vi no meio da multidão, alcei o punho direito e estalou um clamor. Não tinha podido fazer isso desde há vinte e sete anos, e invadiu-me uma sensação de alegria e de força."

Em 1991, foi eleito presidente do CNA e recebeu, de Portugal, a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade.

Mandela e o já então presidente sul-africano Frederik Willem de Klerk, foram condecorados com o prémio Nobel da Paz pelos seus esforços conjuntos pela reconciliação do povo sul-africano.

Em 1994, depois de mais de 40 anos, terminou o Apartheid e Mandela é eleito presidente nas primeiras eleições multirraciais do país. Fez uma nova Constituição sul-africana, e, em 1999, deixou a presidência.

O Tribuna Alentejo identifica-se com o modelo de sociedade democrática, com os direitos do Homem e com as conquistas civilizacionais da vida em democracia. Somos pela pluralidade, pelo respeito, pela liberdade e pelos valores democráticos e humanos, e nisto, Mandela é um exemplo. Poder-se-á dizer que são valores e princípios transversais a muita gente e à maioria das sociedades; a verdade é que muitos já se esqueceram deles, muitos já não lutam por eles e muito poucos o fariam nas condições em que Mandela o fez.

Bem haja Mandela e todos os que - mais ou menos anónimos -  prezam a Democracia e os seus valores, a Liberdade e o Humanismo e, que como ele fez, lutam diariamente por um mundo melhor e mais justo.