25 Outubro 2021      09:57

Está aqui

Historiadores alentejanos publicam roteiro de Odemira

Os historiadores José Manuel Falcão e António Martins Quaresma, nascidos e criados no Alentejo, acabam de publicar a obra “Odemira, Património, Religião, Sociedade e Território”, três volumes que resultam de uma “viagem” de mais de 15 anos.

De acordo com o Diário de Notícias, ao longo de mais de 15 anos, os dois autores andaram por este concelho do Baixo Alentejo (o mais extenso do país) em trabalho de investigação. “A recolha exigiu um contacto próximo com a sociedade local, com os detentores de uma cultura popular baseada fundamentalmente na oralidade, em geral os ‘mais velhos’, cultura que os tempos em que vivemos ameaçam desprezar e, até, obliterar. Essa recolha foi favorecida por anteriores contactos com o território e a sociedade, que nos abriram algumas portas. De resto, foi um trabalho de saber perguntar e saber ouvir”, admitem os investigadores.

O resultado, como sublinha José Mattoso no prefácio, é um manancial único de informação: “basta abrir uma página ao acaso para descobrir muitos nomes de pessoas, quantias exatas em dinheiro, datas (...) Olhando de perto, dir-se-ia que quem realizou a investigação não deixou literalmente escapar nada”.

José António Falcão e Martins Quaresma dizem ainda ter encontrado uma realidade diferente da do resto do território, em que a Geografia ditou as suas regras: “os alentejanos são geralmente religiosos e respeitadores da vida espiritual, como os habitantes de outras regiões marcadas pelo peso histórico não só do Cristianismo, mas também do Judaísmo e do Islão, tendo sempre como pano de fundo um universo pagão, que nunca se extinguiu de todo entre nós”.

“A terra é vasta, as distâncias longas, por vezes difíceis de vencer, sobretudo no pino do inverno e do verão, e a igreja ‘oficial’ alcançou mal, sobretudo a partir do momento em que se tornou assaz normativa, os fregueses mais afastados, que ficaram amiúde entregues a uma religiosidade eivada de antigas tradições”, adiantam os historiadores. Assim, nos séculos XIX e XX, a combinação de um laicismo crescente, com a omnipresença da grande propriedade fundiária e as significativas clivagens sociais acentuaram ainda mais estas diferenças. É esta a diferença entre o Alentejo e as Beiras e o Norte.

Nesta obra é ainda proposta uma viagem pelo rico património artístico (mas também antropológico) desta zona do Alentejo. De Vila Nova de Milfontes a Santa Clara-a-Velha não faltam vestígios de uma vida cultural e religiosa intensa, como atesta a riqueza de templos, como a Igreja paroquial de Santa Clara ou a Igreja de São Salvador de Odemira.

Segundo os historiadores, “há um património muito mais extenso e diversificado, nas suas origens, tipologias e conteúdos, do que se poderia pensar à primeira vista. Isto deixou-nos maravilhados. Não faltam obras de carácter erudito, da autoria de grandes mestres, incluindo autores de relevância nacional e, até, internacional. Há também exemplares provenientes das mais diversas partes do mundo, de África à América e à Ásia, alguns dos quais de enorme raridade, só com paralelos em grandes museus internacionais”.

Ao longo destes três volumes, estão reunidos muitos documentos escritos, iconográficos, cartográficos ou fotográficos até aqui inéditos. O leitor ficará a saber, por exemplo, que, em romagem à Terra Santa, Ricardo, Coração de Leão, e sua armada aqui se detiveram, mas também que Afonso X de Castela, dito o sábio, invocou um milagre de Nossa Senhora nas suas cantigas de Santa Maria. Ouvimos lendas ancestrais, passadas de geração em geração. O segredo, dizem os autores, é a disponibilidade, humildade e solidariedade com que interpelam as fontes. “A arrogância e o preconceito são adversários irredutíveis da investigação, sobretudo nas diferentes áreas das ciências humanas e sociais”.

Esta obra tem edição conjunta da Câmara Municipal de Odemira e da editora Pedra Angular.

 

Fotografia de dn.pt