17 Abril 2021      08:52

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A Fraca forte

Condenada a 15 anos de prisão, Fraca já passara 12 anos nesse lugar imundo, que seriam os piores da sua vida. Iria sair em breve, em liberdade condicional. Nuca lhe passou pela cabeça poder acabar neste lugar onde cada dia era um desafio à sobrevivência. A prisão onde foi parar era a pior de todas. Conhecida amplamente por ser uma prisão de alta-segurança, agregava em aí toda a pior espécie de animais criminosos.

Ao lado da cela da Fraca era a do Dragão de Comodo, conhecido assassino que cuspia nas suas vítimas, cujos músculos paralisavam e depois os comia. Sim, assim mesmo, só assim.

Do outro lado, a Vespa asiática, membro de uma tríade e também ela uma assassina.

Naquela prisão estavam basicamente os piores prestadores do reino animal.

Então como é que Fraca estava ali no meio, entre o que de pior havia. Ela não podia ser assim tão má. Já conheceram alguma Fraca que fosse do pior?

Era uma ave nervosa que facilmente entrava em stress, isso conhecíamos sobre ela. Porém o que de tão errado faria que a levaria a ser considerada como extremamente perigosa para a sociedade.

Então foi assim. Fraca adorava sair e adorava dançar. Todos os sábados, ia para a balada com o seu bando. Num dos sábados, em vez de ir com o grupo para o seu clube preferido, decidiu aventurar-se no lado da cidade que não era nada conveniente nem de boa reputação.

Era uma zona de perdizes motoqueiras, de gatos assanhados e de insectos da pior espécie. Uma Fraca, no meio de tanta gente diferente, seria imediatamente notada. Porém a nossa Fraca não se intimidava, embora estivesse imensamente nervosa. O que a levaria ali, onde não se enquadrava? Talvez fosse a adrenalina de cair num sítio onde não tinha para. Talvez fosse o desejo de conhecer o incógnito, de viver intensamente, fora da sua zona de conforto.

Fraca tinha sempre sido a mais curiosa do seu bando. Seria isso suficiente para enfrentar os perigos que a esperavam?

Acolhida pelo grupo das perdizes motoqueiros que, vendo bem, até eram um grupo de aves bastante porreiras e que adoravam as suas motos e sentir as penas ao ar livre, sentou-se com elas no seu canto. Umas bebiam whiskey, outras cerveja Budlight, outras tequila. Fraca estava no grupo da tequila. Nunca tinha bebido algo tão forte. Depois da 12ª tequila, as coisas começaram a mudar. O olhar nervoso de Fraca acalmou e o seu pequenino cérebro mudou completamente de funções. Deixou de se reconhecer e perdeu todos os sentidos. Não se lembraria de nada a partir daí.

Só nós sabemos o que aconteceu e isso foi pior do que um filme americano, um triller de crime, um filme de ação e crime.

A personagem principal neste era um fraca forte. Forte porque aguentou anos na prisão, sem se corromper. Ao fim de doze anos, não tinha ainda nenhuma tatuagem que marcasse a sua ligação a nenhum clã, ao fim de doze anos não tinha assassinado ninguém na prisão.

Contudo, Fraca matara alguém para merecer tamanha pena? Não. Era uma alma bondosa. Só tinha um problema. A tequila criava no seu sistema uma reação absolutamente inesperada, de fúria contra o capitalismo. Naquela noite, a tequila traria a sua pior reação ao álcool. Se, no outro clube não bebia bebidas tão fortes, neste sentia-se nervosa e sem medo, ao mesmo tempo.

De imediato e não se sabe bem como, passou a comandar as perdizes e convenceu-as a acompanharem-na contra o grande capital. Iriam queimar todos os edifícios na cidade que representavam a opressão capitalista às aves, aos insectos e a todos os animais. A destruição do sistema financeiro era primordial.

Pelas 24h da noite, carregados de cocktails molotov, de galões de gasolina e outras armas de arremesso que as aves conseguem lançar E manusear.

Pelas 4 da manhã tinham queimado metade do centro financeiro, até que a polícia apareceu e foram apanhadas em flagrante delito. Foram, quer dizer, foi a Fraca porque as perdizes piraram-se nas motos e a fraca, como não tinha, ficou sozinha de galão de gasolina nas asas e com ar ébrio. Foi o suficiente para o juiz a condenar a quinze anos de prisão.

Esta é a história da Fraca que era forte, alcunha que ganhou por isso mesmo. A galinha d’angola que fez frente a todos os do sistema opressor. Ninguém, até hoje, consegui explicar o que despertou aquela reação. Não vale a pena.

Fraca passou esses anos na prisão, sem se lembrar do que tinha acontecido, só conhecia as consequências. Lá dentro nunca beberia tequila, continuaria nervosa e, naquele ambiente, ficaria no seu canto.

12 anos depois, era hora de altura de sair. Voltar a ver o ar livre. Começar uma vida nova. Reintegrar a sociedade. Fraca, no fundo, era forte e já o tinha demonstrado.

Alugou um apartamento numa vila pequena e ali ficou, cultivando milho e dedicando-se a uma filosofia budista. Não deixou porém de perder as suas convicções anticapitalismo. Dedicou-se à pintura também. Eram quadros que concentravam toda a sua história, sofrimento e experiências vividas. Tornar-se-ia uma das mais influentes pintoras. No fundo, Fraca era aquilo que já sabíamos, forte!