14 Fevereiro 2021      11:56

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Estrada de Bencatel: beco sem saída ou esperança ao virar da esquina?

Subitamente, quase sem aviso prévio, em meados de janeiro, procedeu-se ao corte da estrada nacional nº 254, que faz a ligação entre Bencatel e Vila Viçosa. 

Há muito que circulavam rumores de que tal pudesse acontecer, tendo em conta o que tinha ocorrido há mais de dois anos, aquando da fatídica derrocada da estrada de Borba, naquele trágico dia 19 de novembro de 2018, que infelizmente nunca esqueceremos…

Esta situação da estrada 254 em concreto, aliada ao encerramento da estrada municipal de Borba e o condicionamento da estrada nacional 255 para Pardais, está a transformar Vila Viçosa numa “ilha”, cada vez mais distante de tudo e de todos, sem que se veja no horizonte qualquer sinal de esperança. E assim vamos ficando cada vez mais esquecidos.

O impacto social e económico desta situação é já notório, mas sê-lo-á ainda mais num futuro próximo, quando a situação pandémica estiver finalmente ultrapassada. O regresso à normalidade que todos desejamos, trará de regresso os turistas, os clientes, os visitantes e os familiares, entre outros.

Por onde virão, em segurança?

A outra pergunta que se coloca é de quem será a responsabilidade sobre esta matéria. Na minha opinião, quem deveria ter acionado previamente todos os mecanismos para solucionar este grave problema em termos de circulação rodoviária, teria sido a Infraestruturas de Portugal.

Este organismo público, talvez amedrontado pelo sucedido em 2018 em Borba, quis “chutar para canto” e “sacudir a água do capote”, optando pela medida que considerou mais fácil, esquecendo, mais uma vez, as gentes que aqui vivem.

Já sabemos que o objetivo é passar a estrada 255 para a esfera municipal, mediante um acordo, para que o IP fique com menos uma “chatice” para resolver. E a pressão para o encerramento veio nesse sentido. Se tal efetivamente acontecer, quais as contrapartidas para o Município?

Ninguém sabe. A responsabilidade adicional é uma certeza. Fala-se até na construção de uma hipotética variante com ligação ao cemitério de Bencatel, no âmbito de um projeto mais abrangente, em termos de melhoramento da rede viária.

Será que esta solução é também a mais viável? E para quando? Privar Bencatel da circulação na sua principal artéria pode também ter efeitos negativos, em termos da própria dinâmica económica. No entanto, se for para melhorar, que se avance rapidamente. Mas também aqui os Bencatelenses deviam ter a oportunidade de ser ouvidos.

Mais uma vez ficou provado que o facto de sermos poucos não ajuda nada quando toca ao acionamento destas prejudiciais medidas. Os votos por aqui, para uma perspetiva nacional, são poucos. Se isto fosse no Norte do país, ou em Lisboa, a dança seria outra…

Rapidamente se apontaram as armas ao empresário responsável da pedreira, que a meu ver é o menos culpado desta situação e até se prontificou para arranjar uma solução.

A zona de extração que explora há muito que tem licença para a atividade que desenvolve e durante anos tem trazido riqueza a esta região. Segundo sei, as recentes alterações legislativas no que concerne ao licenciamento para exploração de pedreiras não são retroativas. Logo, tendo em conta a antiguidade da exploração, a pedreira funcionou sempre de forma legal, como não podia deixar de ser.

Mais uma vez, se algo estava mal neste caso, era a legislação que aparentemente não estava de acordo com a realidade do sector e apenas recentemente se alterou. Correu-se atrás do prejuízo, como acontece em tantos casos.

Sobre este tema, convêm mais uma vez não esquecer o passado. Basta recuarmos às décadas de 80 e 90 do século XX, para nos lembrarmos das toneladas de pedra de qualidade que de aqui saíram para os quatros cantos do mundo e que trouxeram muitas divisas para todos: empresas, trabalhadores, restauração, hotelaria e economia local. Nessa altura, Vila Viçosa estava no mapa.

Não sejamos ingratos. A Zona dos Mármores, hoje mergulhada numa profunda agonia, viveu tempos áureos que injetaram muito capital em toda esta região, para benefício do tecido social e empresarial, trazendo muito dinheiro também para o país.  Convêm fazer as contas.

Apesar de haver muitos problemas conjunturais prévios, o que é certo é que a derrocada da estrada de Borba deu uma grande "machadada" no sector dos mármores. Hoje em dia, é muito difícil lutar contra a carga burocrática e as exigências legais que são impostas, aliadas à escassez de recursos humanos.

Deixo um apelo às associações do sector, às comunidades e às entidades competentes, para um que haja uma mobilização mais sólida e efetiva, no sentido de se encontrar uma solução rápida para este problema, que nos toca a todos. A situação conjuntural não é fácil, tendo em conta todos os outros problemas que nos afetam. Mas, se nada for feito, a indústria dos mármores alentejanos, com mais este problema adicional de cortes e limitações de circulação, sucumbirá em breve...

É óbvio que a segurança está em primeiro lugar, mas penso que é sempre possível encontrar soluções técnicas e estruturais que minimizem os riscos, para não pôr em causa vidas humanas, quer para os trabalhadores, quer para os utentes das estradas deste território, mas permitindo em simultâneo que as empresas do sector dos mármores possam sobreviver.