6 Janeiro 2022      11:17

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E se os Reis Magos não tivessem olhado para cima?

“Até aos Reis é Natal” diz a tradição. Dia de Reis é hoje, o sexto dia de janeiro, doze dias depois do Natal, e o dia em que, segundo a história tradicionalmente contada, num momento denominado como “Epifania”, os 3 Reis Magos chegam a Jesus, após terem seguido a Estrela de Belém.

Ao chegar, os reis consagraram Jesus com oferendas: ouro (símbolo de realeza), incenso (simbolizando a divindade) e mirra (representando o humano e a mortalidade de Jesus), mas, e além do simbolismo, o ouro seria uma garante de condições para a vida de Jesus, a mirra e o incenso são medicinais, podendo servir para ser usadas como repelente de insetos e serpentes, curar feridas ou até para aliviar dores no corpo.

Os 3 reis - Melchior, Gaspar e Baltasar – supõe-se que fossem do Oriente Médio, da Pérsia, e é possível que nem sequer fossem só três, mas este número foi o idealizado pelo cristianismo, sendo perfeito para representar as raças de todo o mundo conhecido à época: Belchior ou Melchior, descendente de ‘Jafé’, representava a raça europeia; Gaspar, descente de ‘Sem’ representava a raça asiática e Baltasar, que descendia de ‘Cam’, representava a raça africana, ou seja, todos descendiam dos 3 filhos de Noé. Tradições orientais falam de doze reis.

Os reis são referidos no Evangelho de Mateus e, não terão sido reis, nem magos, mas sim homens com conhecimento, sábios, cientistas, conhecedores do céu, de astronomia e astrologia e que, não existindo certezas, terão seguido uma estrela ou um cometa, ou até o fenómeno astrológico relacionado com a aproximação entre Júpiter e Saturno, até ao lugar onde Jesus nasceu, Belém.

Este dia é celebrado em vários países pelo mundo fora e as suas origens poderão remontar ao Egipto. Em Portugal, nas celebrações não pode faltar o bolo-rei e o típico cantar das “janeiras”, tradição que, com outro tipo de canções se repete em muitos outros países, e terá tido origem em cânticos que tinham como finalidade que os seus cantantes pudessem receber dádivas.

Em Espanha, sendo o dia em que Jesus recebeu presentes, é o dia em que as crianças recebem as suas prendas de Natal, algo que se pratica também em Itália numa tradição chamada de “Befana”, uma senhora idosa que distribui prendas às crianças. Na França, come-se um bolo chamado “Galette des Rois” à base de amêndoa ou maçã, e que terá sido a origem do bolo-rei português e da Rosca de Reyes espanhola.

Mas, relembrando o título deste artigo, “E se os Reis Magos não tivessem olhado para cima?”, refiro e cito parte de uma homilia proferida pelo Papa Francisco que questiona o porquê de só os magos terem visto a estrela, referindo que tal se deve a que “poucos levantaram o olhar para o céu. Na vida, muitas vezes, contentamo-nos apenas em olhar para a terra: saúde, dinheiro, diversão. Mas, será que ainda podemos levantar os olhos ao céu? Sabemos sonhar, ansiar por Deus, esperar a sua novidade? Os Magos não se contentaram com a vidinha de sempre, mas entenderam que, para viver de verdade, é preciso uma meta mais alta e, por isso, manter alto o olhar”.

Permitam-me aqui a analogia com o filme do momento “Don’t Look up” (“Não Olhem para Cima” de Adam McKay e com Leonardo DiCaprio, Jennifer Lawrence, Meryl Streep e Cate Blanchett no elenco), uma sátira tão realista da sociedade atual que dói; uma sociedade que, perante um evento cataclísmico, que pode significar o fim do planeta, continua a valorizar a ganância, o materialismo, o egoísmo, o ter mais dinheiro e o ter mais poder. Enquanto os defensores destes valores invertidos querem fazer passar a mensagem de que não há nada com que se preocupar e deturpam as informações, usam a mentira, a descredibilização, as fake-news, como caminho consciente para o seu objetivo, outros, cientistas e pessoas que fundamentam a opinião com factos, pedem tão simplesmente que se olhe para o céu, para cima, para se ver a realidade. Traz à memória aquela famosa frase de Bertrand Russel “O problema do mundo de hoje é que as pessoas inteligentes estão cheias de dúvidas, e as pessoas idiotas estão cheias de certezas...”

O termo Epifania, segundo a etimologia grega, significa “aparição; manifestação” e, no caso, tem uma luz como centro propulsor da ação: uma estrela que traz de volta a luz após o solstício

Sendo a estrela o ponto de partida, cabe ao a Homem ação de a seguir e de qual “rei mago” pôr-se ao caminho, o seu caminho. E aqui, tal como no filme anteriormente referido, é mais fácil fazê-lo com humildade, levando em si o essencial, o realmente importante, deixando de parte os pesos inúteis da vida e o materialismo, num caminho incessante que requer tolerância e aceitação, valores tão essenciais à vida em sociedade e que estão a ser cada vez mais postos em causa por interesses pessoais, privados e grupais sectários que, para validar o seu ponto de vista, recorrem aos métodos referidos no filmes e quase fazem uma ode à ignorância.

Pare um pouco e pense em que mundo quer viver. Olhe para cima, como os Reis os Magos, veja as estrelas e compreenda que somos só uma parte do todo e que, com um pouco de cada um, é possível continuar a construção de uma melhor sociedade.

Em qualquer sociedade um dos princípios essenciais é a Liberdade; ninguém nem nenhum meio de comunicação deve ser coagido ou impedido de fazer o seu trabalho como aconteceu, esta semana, com o ataque informático ao grupo Impresa, e que nem Marques Mendes conseguiu antecipar.

Estamos cientes que Liberdade é muito mais que informação, mas sem informação certamente não há Liberdade.  #liberdadeparainformar.

 

Imagem de theologie-naturwissenschaften .de