10 Outubro 2021      12:21

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É hora de dizer “Morte à Pena de Morte”

Hoje assinala-se o Dia Mundial Contra a Pena de Morte.

A data pretende sensibilizar os países e as populações contra a pena de morte e defender o mais essencial dos direitos humanos e do qual advêm todos os outros: direito à vida!

Este dia foi criado em 2003, numa iniciativa conjunta de organizações não governamentais, governos e organizações jurídicas e repudiando a Organização das Nações Unidas (ONU) e a União Europeia a legalidade e o uso da pena de morte.

Neste contexto, Portugal foi o primeiro país do mundo a abolir a pena capital na Lei Constitucional, após a reforma penal de 1867. "Desde hoje, Portugal está à frente da Europa. Vós, os portugueses, não haveis cessado de ser navegadores intrépidos. Ides sempre para a frente, outrora no Oceano, hoje na Verdade. Proclamar princípios é ainda mais belo do que descobrir mundos." - escreveu o famoso escritor francês Victor Hugo ao jornalista português Brito Aranha em 1867.

No mesmo ano, o autor francês escreveu também uma carta ao diretor do Diário de Notícias, Eduardo Coelho, e que foi publicada a 10 de julho desse ano: "Está, pois, a pena de morte abolida nesse nobre Portugal, pequeno povo que tem uma tão grande história! (...) Felicito o vosso Parlamento, os vossos filósofos. Felicito a vossa Nação. Portugal dá o exemplo à Europa. Disfrutai de antemão essa imensa glória. A Europa imitará Portugal. Morte à morte! Guerra à Guerra! Ódio ao ódio! Vida à vida! A liberdade é uma cidade imensa da qual todos nós somos cidadãos. Aperto-vos a mão como um meu compatriota na humanidade, e saúdo o vosso generoso e eminente espírito."

Atualmente cerca de 82% dos países suspenderam ou aboliram a pena de morte, um número que subiu esta semana mais uns pontos percentuais com o anúncio da promulgação da abolição da pena de morte na Serra Leoa – estava prevista para penas por roubo agravado, homicídio, traição e motim – e onde já não eram realizadas execuções capitais desde 1998.

“Hoje estamos de novo a fazer história” – afirmou o presidente da Serra Leoa, Julius Maada Bio.

Mas não é assim por todo o mundo. Apesar de 2020 se ter verificado um decréscimo nas execuções por pena de morte – uma tendência que se verificou nos últimos 5 anos - dados da Amnistia Internacional revelam que o Egito triplicou o número de execuções anuais, a China utilizou a pena de morte para reprimir infrações relacionadas com os esforços de prevenção da Covid-19, que a anterior administração dos EUA executou dez pessoas em menos de seis meses em 2020, acontecimentos que levaram Agnès Callamard, Secretária-Geral da Amnistia Internacional a dizer que “Enquanto o mundo se concentrava em encontrar formas de proteger vidas da Covid-19, vários governos mostraram uma determinação perturbadora em recorrer à pena de morte e executar pessoas acontecesse o que acontecesse.”

Os 5 países mais executores serão a China – que classifica o número total das suas execuções e sentenças de morte como Segredo de Estado. A Amnistia Internacional e outras organizações acreditam que a China execute milhares de pessoas todos os anos, e que estará à frente do Irão (246+), Egito (107+), Iraque (45+) e da Arábia Saudita (27). Estes quatro terão sido responsáveis por 88% de todas as execuções conhecidas em 2020.

São ainda muitos os países, sobretudo na região Ásia-Pacífico, que continuaram a violar o direito internacional e as normas que proíbem o uso da pena de morte para crimes que não envolvam a morte intencional. Delitos relacionados com droga levam à pena de morte na China, Indonésia, Laos, Malásia, Singapura, Sri Lanka, Tailândia e Vietname; para corrupção na China e Vietname; e para blasfémia no Paquistão.

Arautos da salvação, avançados em ignorância, interessados no retrocesso e na venda da banha da cobra a troco de percentagens eleitorais, falam em trazê-la de volta a Portugal, recuando até 1867.

A incoerência ideológica e discursiva é tanta que acabam por querer imitar alguns dos países que tanto criticam no que aos direitos humanos diz respeito; enquanto isso, outros progridem e, em 2020, o Chade e o estado norte-americano do Colorado aboliram a pena de morte e Cazaquistão e Barbados se preparam para o fazer.

Até abril de 2021, de acordo com a Amnistia Internacional, 108 países aboliram a pena de morte para todos os crimes e 144 países aboliram na prática ou na lei.

Não estando completamente de acordo com a frase inicial de Tolkien na citação que se segue, reflita um pouco sobre ela: “Muitos dos que vivem merecem a morte. E alguns dos que morrem merecem viver. Pode dar-lhes vida? Então não seja tão ávido para julgar e condenar alguém à morte.”

Imagem de rfi .fr