“O guarda-redes deu, literalmente, o corpo às balas.”
Foi assim que o comentador de um canal de televisão se referiu à defesa corajosa do guarda-redes do Peru num jogo do mundial de futebol.
Todos sabemos que o mundo da bola é prodigo em dribles à gramática, mas este é um drible que está na moda, um drible que chega às quatro linhas de Portugal inteiro.
Mas é uma finta dramática, daquelas que partem os rins aos defensores da língua portuguesa.
O sentido literal das coisas, o «literalmente», aplica-se quando a expressão está limpa de metáforas, quando a expressão não tem um sentido para além do que é dito.
Ora, para o guarda-redes ter, literalmente, dado o corpo às balas, teria de existir uma arma efetiva em campo e o agente da ação teria de se colocar na linha do disparo bélico. Isso não aconteceu. O que aconteceu, literalmente, foi que o guarda-redes do Peru se colocou na frente da bola rematada com força pelo jogador adversário.
Usa-se a abusa-se do termo “literalmente” sem a preocupação do rigor, sem a preocupação de se preservar a correção do discurso. Podemos considerar que o desporto em geral e o futebol em particular é emoção, e que no calor do momento as palavras ganham vida e fogem do emissor sem a fiscalização da razão. Isso é aplicável ao adepto, mas não o pode ser a quem tem responsabilidades, a quem narra os acontecimentos para o mundo, a quem, inconscientemente, está a espalhar a asneira, está a fomentar a incorreção, está a subverter o rigor da língua pátria e está a alimentar a moda do literalmente ignorante.
«O guarda-redes deu, metaforicamente, o corpo às balas.»
Imagem de exitosanoticias.pe
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