15 Dezembro 2020      09:42

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Dar a vida para fazer o que está certo

António Doce, o agente da PSP que morreu em Évora

É o dever e a missão de qualquer força de segurança garantir o bem-estar, a defesa e a protecção da comunidade que preserva, em última instância, mesmo com o sacrifício da própria vida.

É esta a essência do juramento feito por quem tem a valentia de fazer parte de uma instituição que zela pela protecção de todos, especialmente quando as circunstâncias de ser guarda, de ser polícia ou de ser militar, nesta nação, não sejam as mais atractivas, as mais favoráveis, ou as mais justas.

Na noite de 12 para 13 de Dezembro Portugal perdeu um polícia bom. Alguém que não conhecia mas que se tornou merecedor do meu total respeito e admiração, pessoa à qual devo a minha gratidão como cidadão português, e pela qual expresso o maior orgulho em ter protegido e servido a cidade que mais estimo, Évora.

Num tempo estranho onde se podem observar manifestantes anti-polícia a empunhar cartazes com as frases mais execráveis, relatos hediondos sobre determinadas acções lamentáveis de agentes da autoridade portugueses (não apenas do SEF), ou uma observável intimidade entre certas falanges das forças de segurança portuguesas e movimentos políticos de carácter duvidoso envoltas num certo obscurantismo, gestos como o do agente António Doce são um raio de luz que irrompe pelas trevas e alimenta a esperança de uma sociedade civil lúcida, de uma sociedade civil responsável e de uma sociedade civil corajosa e firme na defesa do cidadão, da moral, da responsabilidade pública, e sobretudo, da dignidade como direito de todo o ser humano.

O agente António Doce, mesmo fora de serviço, desarmado, no decorrer de uma rotina que apenas à sua vida pessoal dizia respeito, não considerou por nenhum momento manter-se indiferente ou inerte perante uma situação repugnante de violência sobre uma mulher. Agiu em defesa de quem dela necessitava, e isso custou-lhe a sua própria vida, como dita o juramento que um dia fez. Cumpriu o seu dever de forma exemplar, mesmo com todos os contratempos daquilo que significa ser polícia em Portugal.

Nada vai trazer este homem de volta para junto da esposa, dos filhos, da restante família ou dos amigos, e esse é o maior lamento deste acontecimento. Porém, o seu gesto tem impreterivelmente que ficar imortalizado em tempo próprio e em local oportuno, para que o sacrifício da sua própria vida e os seus nobres motivos perdurem na memória futura da comunidade que este se dedicou a servir, e não caiam no esquecimento e no abafamento pela espuma dos dias.

Numa era onde desportistas e celebridades são patronos de ruas, avenidas e aeroportos, e os verdadeiros heróis do dia a dia são condenados ao esquecimento, neste mundo de idolatria ao contrário, imortalizar o nome e a acção heroica de António Doce não é apenas necessário.

É moralmente obrigatório.