7 Setembro 2019      11:04

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D de Dor

Tantas palavras há para falar entre aquelas que começam pela letra D. Optei por começar a escrever sobre algo que todos nós, algum dia já sentimos – dor. Seja ela física, emocional, racional, irracional. A dor é comum a todos nós e em tantas situações devastadora. Dói quando falamos de dor. Dói quando nos sentimos sós ou quando alguém, através de qualquer palavra, começada por qualquer letra nos trespassa o coração sem qualquer piedade.

A dor existe em nós, e é através de nós que continua a existir e se propaga aos outros que nos rodeiam, que sentem e que nos sentem. Como já partilhei, a dor assume diversas formas e tipologias. Podemos senti-la de forma física. Uma ferida que se instala no nosso tecido muscular e nervoso, na nossa pele. Uma ferida que sangra ou, aquela que não sangra mas que se sente debaixo da epiderme. Essas dores são as visíveis, as que nos fazem gritar, as que nos fazem contorcer e são também as de mais fácil tratamento com remédios inventados pelo homem.

Outras dores há que não se evidenciam tão facilmente no sistema nervoso, no sistema muscular ou na própria pele, através de ferida aberta. São feridas silenciosas e não físicas que nos habitam e nos destroem a cada momento que passa. Essas dores são as piores, as mais tenebrosas, aquelas que levaremos ao túmulo sem pronunciar uma palavra que as expresse. Podem estas dores ser aquelas que sentimos de forma mais aguda. Podem estas dores ser as que fazem, algumas vezes, jorrar lágrimas e tantas vezes nem essas as evidenciam dentro de nós. E são estas dores que mais nos devem preocupar.

Já se inventaram medicamentos para quase todas as dores, mesmo as silenciosas. Têm um efeito silenciador a quem já não usava as palavras para se expressar, para se fazer sentir. Estas, mais do que as outras, devem preocupar-nos quando as sentimos próximas, ou mesmo dentro de nós. São como uma nuvem negra que ocupa todo o interior do ser humano. São como uma nuvem negra que espreita no olhar das mulheres e dos homens que a transportam. É importante não alimentar a dor escondida no peito. É importante destruí-la quando ainda é só um bolbo ou uma raiz que busca medrar.

Porém, nem só no silêncio se esconde a dor. Tantas vezes a cantamos. Amália cantou e deu, vezes sem conta, de beber à dor. Tantos nos falam da mesma em outras línguas, dolor, pain, douleur, schmerz… e em todos reconhecemos e sabemos o exato significado dela, porque todos nós, em alguma altura já a sentimos.

Há diferentes tipologias de dores. Umas, como as do parto, ao mesmo tempo são sinónimo de felicidade sendo em si atrozes. Outras são tão ferozes como a partida de um filho, de uma mãe, de um pai, de um irmão ou irmã, de familiar, de amigos…essas dores nunca se curam. O tempo passa e ficam adormecidas debaixo da pele e no nosso olhar. Espreitam sempre, na forma de lágrimas e aperto na garganta e no peito quando nas palavras ou na nossa mente os recordamos. A pele estremece e a memória reaviva a dor. A ausência é dor forte.

Mas dor é também um sufixo. Nem só estas três letras se resumem a aspetos negativos. Elas são também sufixos que se aliam a outras palavras e lhes dão um encanto especial. Vejamos alguém que encanta e juntemos-lhe o sufixo -dor.

Passamos a ter um encantador, como temos um lavrador, um pescador, um mercador e até mesmo um senador. Há também aqueles que muito falam e são faladores e os que muito trabalham e são trabalhadores.

A dor é o início, é só e é o fim. E na ideia que temos dela, principalmente quando está sozinha ou junto connosco, passamos a ser um só que não se desagrega, apesar da nossa luta para a expulsar. Uma vezes conseguimos, outras vezes não sucedemos, mas o que importa é não parar de tentar.