10 Novembro 2018      09:12

Está aqui

Costureira

Uma mulher que media dois metros de altura. Gigante no meio dos pigmeus. Tão grande, tão grande que o marido cada vez que passeava com ela, chegava-lhe à cintura. Era uma aldeia enorme, cheia de gente pequena. Uma mulher que media dois metros de altura destoava de tudo o resto. Não se enquadrava, mas também há tanta coisa que não se enquadra e, no fim, após nos habituarmos, passa a ser normal. A vida é mesmo assim. Naquela aldeia ou em qualquer outra.

A casa da mulher gigante era maior que todas as outras da aldeia, porque, lá está, tinha de ser assim. Se a casa fosse pequena, a mulher não caberia lá dentro. Foi preciso que o seu marido, quando se casaram e decidiram fazer casa, arranjasse uma casa maior do que as outras. A construção levou dois anos. Até aí, nesse espaço de tempo, dormiam na aldeia dos Grandes, mais conhecida por A. Dos Grandes.

Quando a casa ficou terminada, mudaram-se então para a mesma. O homem, que era carpinteiro, fez as mobílias para a casa. Fê-las à medida da mulher e isso deixou-a feliz. Ela não precisava sentar-se numa cadeira pequenina, nem tinha de se baixar para arrumar a casa. Já o marido tinha um problema porque andava sempre a fazer exercício físico, para subir para a cadeira, para subir para a cama, para chegar à mesa. Pode parecer-vos exagero, mas era mesmo assim. Até para beijar e afagar o cabelo da mulher, as coisas se complicavam e o pobre homem andava num virote.

Na carpintaria, os outros homens bem lhe perguntavam como tinha conhecido e como tinha conseguido casar com aquela mulher tão alta. E, cada vez, ele lá repetia a forma como se tinham conhecido. Num dia de nevoeiro, em que ele andava nos arredores da aldeia, à pucarinha, viu, ao longe, acima da neblina o rosto e os cabelos ao vento daquela mulher. Logo o seu coração pequenino bateu de tal forma que os míscaros começaram a saltar do chão e ele ficou perdidamente apaixonado pela mulher que via ao longe. Bem, também era a única coisa que via ao longe, com tamanho nevoeiro.

Ela teve mais dificuldades em vê-lo. Foi preciso que ele a pisasse para ela olhar para baixo e ver aquele que seria o seu companheiro dos dias grandes e pequenos. Mal o viu, sentiu que aquele homem era fofinho e apaixonou-se também. Esta é uma história de amor que começou num dia de nevoeiro. Diz-se na aldeia que, nessa mesma altura passou por eles D. Sebastião que andava à procura de Portugal e, querendo pedir-lhes direções, foi ignorado porque ambos estavam perdidamente apaixonados e não notaram na presença do rei. Não sei se é a realidade ou não. Pode ser.

O namoro foi penoso, mas no fim valeria a pena. Tudo vale a pena. Nem que seja para ocupar o tempo e pensarmos que temos um objetivo. Neste caso concreto, o objetivo do homem foi adaptar as coisas, a sua vida, àquela mulher. Para ele não havia outra e aquela valia por duas. O casamento foi ao ar livre, a igreja era pequena para a família da mulher. Isto porque ela era, da família a mais baixinha. Tão baixa que lhe chamavam a Rodas Baixas. Aceitaram pois bem que ela casasse com alguém ainda mais baixo. Cada panela tem o seu testo e aquela mulher tinha aquele homem. Nos bons e nos maus momentos, adaptaram-se um ao outro e eram felizes assim. A vida corria-lhes bem e era fácil. Difícil era mesmo a vida das costureiras da aldeia a fazer tamanho que servissem à mulher. Isso sim era uma empreitada!  

 

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