1 Março 2020      13:00

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Confissão ao meu amor (im)possível

Mil e uma desculpas ao meu amante desconhecido. A ti. Desculpa-me.

Creio que o meu amor tem ossos frios e se esconde como o vento entre as folhas de todos os jacarandá-mimosos.

Creio que o meu amante descansa o seu corpo numa cama com lençóis frios e eu não quero verter mais lágrimas, mas eu quebro a minha alma assim mesmo.

Parece que não sei o quão cruel eu posso ser, mas será que ele sabe que o nosso sangue é da mesma cor, e que sangramos da mesma maneira? Desculpa-me por não acreditar que alguém comece realmente a apaixonar-se por mim. A paixão ferve; o amor queima. Não me importaria de morrer numa fogueira. Desculpa por engolir todas as minhas palavras até ao osso. Confesso que custam a passar pelo meu corpo; costumam cortar-me a respiração também.

 Fica. Guarda os teus rochedos, pois isso é tudo o que conheces de ti (e de mim), e nada é assim tão simples. Desculpa por ser tão cega e letárgica, mas eu sou assim. Tenho um acidente, destruo o carro e culpo a estrada. Eu parto o coração e culpo o amor; ou a ti? O amor parte, alguma vez, na vida?

Creio que cada fôlego seja um desperdício em mim. Só espero que nunca

percas as cicatrizes que deixaste no passado. Isso criou-te. Criou-me. Agora, cria-nos. O milagre da criação, através dos cacos de vidro que ambos apanhamos do chão para podermos cortar as partes que menos amamos da nossa essência. Mas eu gosto da imperfeição. Não me importo que não te cortes por mim. Não o faças.

Quando era criança queria ser princesa. Julgava que isso fosse ser alguma coisa. Os meus parentes estão sempre a relembrar essa minha fase da infância. Mais tarde, já quis ser veterinária. Médica. Professora. Jornalista.

Já quis ser tudo e hoje não sou nada. Já fui tudo. Não sou nada. Só quero ser algo, agora. E sempre. Eu não sou nada sem fingir. Sei dos meus defeitos e não vivo sem eles. Já fui pessoas diferentes muitas vezes e tenho de ir. Deixa-me ir. Deixa-me ser no meu próprio corpo. Fazemos o mesmo todos os dias para reservarmos um lugar. Mas um lugar onde? Levantamos o copo com a mão e sentimos a mediocridade a queimar a nossa garganta. Uma bebida dolorosa e repugnante. Penso que me faz esquecer do teu toque; da tua pele pálida em contacto com a minha. Preciso de sentido. Preciso de ser alguém, por favor. Preciso de ser algo. Não sou nada.

A minha ignorância ganhou mais uma vez e eu errei em não ter percebido isso desde o início.

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Natural de Reguengos de Monsaraz, Beatriz Velez tem 17 anos e estuda Ciência Política no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Escritora desde os 13 anos, amante dos animais e da Natureza.