14 Maio 2020      11:45

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Autoritarismo bom

Vivemos tempos bizarros, e infelizmente temo-los aceite com estranha e preocupante indiferença. Não sei se os costumes são brandos, se o povo é sereno, ou se somos todos uma cambada de carneiros. Tenho dúvidas.

O que sei é que não podemos permitir que um ministro nos diga o que a ministra da saúde nos disse no passado dia 2 de maio para justificar uns ajuntamentos e proibir outros, que “as instituições têm sempre uma outra forma de representação social que os indivíduos não têm”. Não podemos permitir porque essa seria provavelmente a justificação que um ministro de Salazar daria precisamente para justificar uns ajuntamentos e proibir outros. Não podemos dizer que este autoritarismo é bom porque é de esquerda.

Assistimos ao folclore que foi o 1º de Maio na Alameda. Assistimos à segunda figura do Estado a espumar ódio, enquanto se recusava a andar “mascarado”, para enfiar a dita máscara apenas uns dias mais tarde, numa atitude que o envergonhou tanto a ele quanto ao Estado que ele representa. E assistimos agora à polícia marítima a expulsar cidadãos, absolutamente isolados dos demais, do areal e da água porque cometeram o crime de lesa pátria de ousarem sentar-se no chão ou dar um mergulho. E ouvimos nos megafones as palavras que pensávamos terem ficado nos livros de história: “Cumpra as ordens da autoridade! Cumpra as ordens da autoridade!”.

Não pode ser um decreto governamental a dizer se o “Natal é mais importante do que o aniversário”. Ou se o 1º de Maio é mais importante do que o 13 de Maio, para um merecer autocarros pagos pelo erário público a transportar os sindicalistas e o outro merecer 3.500 militares a guardar os fiéis. Ou se uma coreografia da CGTP é mais importante do que o funeral dos nossos pais e dos nossos avós. Porque, no dia em que aceitarmos que nos digam isso sem nos revoltarmos, teremos desistido da democracia. Infelizmente, já estivemos mais longe.