3 Março 2021      10:28

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Álcool gel de adegas alentejanas afastado por produtos “sem controlo”

As empresas vitivinícolas do Alentejo não têm capacidade de competir no mercado de álcool gel devido à proliferação de produtos baratos, mas “sem controlo” das autoridades, avança a Lusa.

A informação foi avançada pelos responsáveis da Ervideira e da Adega Cooperativa da Vidigueira, Cuba e Alvito, que foram das primeiras adegas a apoiar a linha da frente do combate à pandemia de covid-19, numa altura de enorme escassez de álcool gel. Contudo, um ano depois de pandemia, estão praticamente “fora do mercado”.

O diretor executivo da Ervideira, no concelho de Évora, mas integrado na sub-região vitivinícola de Reguengos de Monsaraz, explicou que o mercado foi inundado por produtos muito gelatinosos, mas que “não têm 70% de álcool”, conforme a legislação em vigor, e que são vendidos “com 6% de IVA”.

Duarte Leal da Costa acrescenta: “ou seja, estão completamente fora da legislação, não são sanitizantes, mas as pessoas põem um produto qualquer nas mãos e acham-se seguras. Então, o mercado tornou-se num mercado de preço e não de produto sanitizante”.

A Ervideira produziu, desde o início da pandemia, 25 mil litros de álcool gel, do qual ofereceu às autoridades de saúde e instituições locais toda a primeira parte, “cerca de 15%”, antes de começar a comercializar.

No entanto, atualmente, o mercado está invadido de “produto tão barato” que as próprias instituições, que antes foram apoiadas pela adega, “já não estão a pedir” esse tipo de donativo. “E quando digo barato, é um produto que não está conforme, mas não interessa. A partir do momento em que você, na sua loja, é obrigado a ter um álcool gel, você tem. O produto não é conforme, mas já ninguém o chateia. Aqui o segredo é ninguém o chatear”, apontou Leal da Costa.

Já o presidente da Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito (ACVCA), que ofereceu pelo menos 2.500 dos cerca de 13.000 litros de álcool gel que produziu nos últimos 12 meses, reconhece que o desinfetante produzido a partir de álcool vínico “não é o mais competitivo” e, por isso, “está em desvantagem”.

Mas, segundo José Miguel Almeida, o problema passa pelas “importações de outros países” de produtos que “não têm o controlo que tem o produto feito em Portugal”.

O responsável acrescenta ainda que “efetivamente aparecem produtos à venda em Portugal” já ao consumidor final “com preços absolutamente espantosos. Eu, nesses casos, duvido sempre daquilo que é o processo e a origem, mas quimicamente não tenho dados para isso [comentar a legalidade dos produtos]”.

Note-se que a cooperativa do Baixo Alentejo fez mesmo um investimento “a rondar os 100 mil euros” para criar uma unidade de produção de álcool gel com recurso a “fundos nacionais e europeus”. O produto, de resto, foi responsável por “10% do volume de vendas” da loja da ACVCA em 2020, mas já não tem, neste momento, uma procura que permita à unidade “estar permanentemente a trabalhar todos os dias”, embora a adega vá continuar a produção “sempre que for necessário”.

Para José Miguel de Almeida, “este é um equipamento que perdurará durante décadas, vai permitir-nos continuar a produzir este produto sempre que necessário e, provavelmente, surgirá alguma inovação desta própria unidade, um novo produto que se adapte às necessidades e ao mercado de futuro, mas não creio que o [álcool] gel venha a representar algo de muito expressivo no futuro”.

Na Ervideira, esta produção não envolveu “investimento nenhum adicional”, além da aquisição “das componentes químicas” e o trabalho dos funcionários e das máquinas. A adega vai continuar a produzir álcool gel enquanto houver “empresas interessadas nisso”, mas Duarte Leal da Costa acredita que a procura por este produto vai desaparecer, tal como a as máscaras, assim que a vacinação estiver generalizada.

“Eu espero que seja assim. Que nós, portugueses, voltemos a ver o sorriso uns dos outros, a [ter a] nossa forma de viver, que é a olhar na cara dos outros”, frisando ainda: “a [ter a] nossa forma de negociar. As pessoas olham-se e respeitam-se”.