11 Setembro 2015      15:37

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HÁ UMA LICOREIRA NO ALENTEJO CHEIA DE SEGREDOS

Marina Canhoto é a fundadora da Licoreira da Villa, marca criada em 2014 em Évora, que tem como ponto de partida os licores e a vontade de preservar um saber antigo, um legado familiar, através da recuperação de receitas que estavam na família há muitos anos. Fomos provar estes licores artesanais feitos sem pressas neste nosso Alentejo. Fique a saber mais em https://www.facebook.com/licoreira?fref=ts

A história da Licoreira da Villa é uma história antiga e começa com a arte de uma senhora que recolhia e seleccionava ingredientes nos campos do Alentejo com os quais confeccionava licores, que deliciavam os convidados das bodas e baptizados. Essas receitas e saberes haviam sido cedidos por freiras, que estavam longe de imaginar a herança que constituíam.

Hoje a Licoreira da Villa produz licores caseiros, geleias e compotas, sem que nunca tenha perdido o método tradicional de produção que a fez nascer.

Tribuna Alentejo – A Licoreira da Villa renasceu a a partir da vontade de recuperar um legado antigo... A quem pertenciam as receitas que agora foram, de certa forma, reinventadas?

Marina Canhoto – As receitas pertenciam à minha bisavó, uma senhora que exercia a função de parteira deslocando-se de casa em casa para ajudar as mãe a dar à luz, era acarinhada por todos, a quem as crianças chamavam de madrinha. Sempre que fazia um parto ela presenteava a família com uma garrafa de licor, e se notava necessidades de alimentos, preparava um cabaz que fazia chegar por um dos filhos. Recolhia ingredientes nos campos do Alentejo, e com eles elaborava licores, que eram a excelência na degustação nas bodas e batizados da sua época.

As suas receitas, dizia terem sido cedidas por freiras com quem tinha uma boa relação.

Para além deste legado familiar, também fiz uma recolha de receitas das tabernas de Borba dos anos 50/60.

Tribuna Alentejo – Qual é a diferença entre estes “licores da villa” e os antigos?

Marina Canhoto – Estes licores aparecem vestidos de modernidade, têm uma marca própria que lhe concede identidade e podem ser degustados longe da sua origem.

 

Tribuna Alentejo – Foi no âmbito de uma candidatura a um prémio na área do Empreendedorismo que decidiu avançar com este projeto para a frente. Quais foram as circunstâncias que levaram à candidatura ao Prémio InovEmpreende 2014, atribuido pela AIP?

Marina Canhoto – Visitei o NERE por outras razões e a fui convidada a participar no projeto InovEmpreende por ter desistido um dos participantes (risos). Como o desafio é uma constante na minha vida e a vontade que sempre tive de não deixar perder este legado que me foi deixado, resolvi aproveitar a oportunidade. Também o gosto, que todos partilhamos, por produtos genuínos e sem truques, com ingredientes que crescem calmamente no solo e ao sol do nosso Alentejo e, que marcam o património gastronómico da nossa terra. Além disso, também porque acredito que o saber de gerações é um bem precioso.

Vi neste projeto a possibilidade de aprender, com o trabalho que ia desenvolver com o apoio do Alexandre (o seu mentor), com as críticas pertinentes que iria receber, e até mesmo com o trabalho desenvolvido por outros colegas. Refleti que sairia dali munida de mais capacidades e ferramentas para desenvolver este ou outro projeto e por isso aceitei.

Tribuna Alentejo – O que significou em termos práticos a Licoreira da Villa ter sido a vencedora?

Marina Canhoto – Foi bom, fiquei feliz, mas a sentir o compromisso de dar continuidade ao projeto. Foi um impulso a continuar, fez-me acreditar que o meu produto tinha valor e que podia fazer a diferença, deu-me também suporte económico para os primeiros desenvolvimentos.

 

Tribuna Alentejo – Quais são os principais desafios que uma empreendedora encontra ao tentar lançar uma marca própria numa região como o Alentejo? Há algum conselho que considere útil dar a outras pessoas, especialmente a mulheres, que tentam seguir esse percurso?

Marina Canhoto – O primeiro desafio é todo o processo legalização, o tempo de espera por cada resposta pode ser de meses. Encontrar parceiros certos e profissionais que respondam atempadamente às nossas necessidades. Vários serviços especializados encontram-se a alguma distância.

Aconselho muita resiliência, que sejam persistentes e flexíveis. Possivelmente vai-se sentir num labirinto, não desista de acreditar, procure a saída empenhadamente.

Tribuna Alentejo – Fale-nos um pouco dos seus produtos... Que sabores podemos encontrar e onde podemos encontrá-los venda?

Marina Canhoto – Os nossos produtos são sazonais, de acordo com a natureza. A nossa filosofia tem por base a seleção dos melhores ingredientes, procedentes de produções familiares, pequenos produtores, que produzem para consumirem e por isso produzem o que é bom.

Por isso os lotes de um produto pode terminar e dar lugar a outro que tenha atingido o seu período de maturação. Em licores, nós produzimos: “luar de agosto”, “Mari Madalena”, “Baco”, “Poejinho de Borba”, “Rosas Vermelhas”, “Curaçau”, “Amor-A”, “Avô José”. Neste momento o Baco e o Curaçau estão a cumprir tempos de repouso, o Avô José podemos dizer que está a dar os primeiros passos.

Embalamos açorda com toda a tradição alentejana.

E com a mesma filosofia, decidimos ampliar a utilização dos ingredientes na inovação de sabores e surgiram as geleias, as açordas e os chutneys. As geleias de malagueta, de vinho e de laranja cavalo são delicadas e saborosas, as açordas a marcar a tradição alentejana e os chutneys são uma inovação na adaptação dos sabores.

Já nos encontramos em várias cidades como: Lisboa: Casa do Alentejo; Alcobaça: Centro histórico; Tomar: Amor Lusitano; Covilhã: Gourmet à porta; Évora: Divinus gourmet, Gentes da Nossa Terra, Com Saudade, Mercearia dos Alamos; Vila Viçosa: Hotel Marmóris, Solar dos Mascarenhas, Paladárt, Tertúlia Perfeita; Elvas: Casa do Forte e Loulé: 11 Gourmet.

Tribuna Alentejo – Como é o processo de confecção dos produtos? Tem mais pessoas a trabalhar com a Marina?

Marina Canhoto – Selecionamos os ingredientes, muito frescos e com a maturação desejada. Higienizamos cuidadosamente, e são distribuídos para os processos de produção dos diferentes produtos. Nos licores são feitas macerações, filtragens, novas macerações e tempos de repouso, a temperatura controlada num processo nunca inferior a 6 meses.

As geleias exigem o processo de extração da pectina da fruta para fazer a gelificação tendo em conta que não usamos aditivos na sua confeção.

Para os chutneys, com muita paciência curtamos finamente os legumes e confecionamos a receita ao som do fervilhar da panela.

Todos estes processos são feitos à mão com muito amor e tradição.

Tenho a preciosa ajuda do meu filho, todo o designer foi desenvolvido por ele. Em picos de trabalho já solicitei a ajuda de amigos, na recolha de ingredientes e no processo de rotulagem.

 

Tribuna Alentejo – Onde imagina a Licoreira da Villa daqui a 5 anos? O que espera para este projeto?

Marina Canhoto – Daqui a 5 anos imagino a Licoreira da Villa algures, orgulhosa por produzir produtos de qualidade, fiel à sua filosofia de crescimento sustentáveis. Não queremos nem podemos competir com os produtos massificados, queremos sim dar alternativa ao consumo desses produtos, continuando a produzir com o melhor do Alentejo.

 

Tribuna Alentejo – O que depende de si para o concretizar?

Marina Canhoto – Manter a qualidade, aproveitar todas as oportunidades para dar a conhecer a nossa marca ao mundo. Continuar com empenho, persistência e dedicação.