9 Novembro 2014      23:21

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25 anos da queda do muro de Berlim – derrubemos os muros de hoje

No dia 9 de novembro de há 25 anos, o mundo estava colado à televisão. Quer por alegria, quer por medo, quer por um misto de ambas e outras tantas emoções, o derrube (a queda não; quedas damos sozinhos, o muro foi derrubado) do muro de Berlim deixava o mundo em suspenso e nada seria igual.

Em 1989, o mundo vivia ainda na Guerra Fria (que Putin parece muito interessado em fazer regressar) e o derrube de um muro com 28 anos representou não só uma abertura de um mundo face a outro, de uma Berlim face a outra, mas essencialmente a junção de famílias, de amigos, de amantes; de cidadãos de uma mesma cidade e de um país estilhaçado pela guerra, pela segunda vez.

Quando o muro foi construído em 1961, de um lado o mundo ocidental e do outro o controlo soviético de um pais despojo de guerra. Quase 70 quilómetros de pedras, cimento e tijolos, com torres, redes metálicas eletrificadas, arame farpado e vigias apertadas com cães e tropas nada hesitantes, formavam o muro. Tudo em nome de duas ideologias fanáticas que nunca tiveram realmente em conta os valores mais sagrados da Humanidade. Não se tratava de opção; não havia. Ditado por um, ou por outro, o muro, apesar de servir propósitos geopolíticos e económicos, nunca fora entendido por aqueles que sempre puseram valores como a liberdade, o amor, a união, a família, a felicidade à frente de qualquer bandeira, fosse com suástica, fosse com foice e martelo. Aliás, por muito que qualquer sistema político tente abafar, calar os sentimentos e valores que citei, seja a ditadura, a democracia, ou outro qualquer; por muito que as pessoas até aceitem inicialmente por seguidismo, medo ou por entrar na euforia “main-stream”, mais tarde ou mais cedo estes sentimentos virão sempre ao cimo, e farão com haja sempre um sentimento rebelde, de revolta que quando se torna grupal supera todos os medos e conquista todas as ambições. Da confusão, da repressão, nascerá sempre mais desejo de liberdade, novas correntes, novas vontades de mudar e de fazer.

As culturas, as famílias, os hábitos e a história não podem ser separados a régua e esquadro e por opção de quem não vive nos locais em questão; notem-se as confusões que se criaram em África e no Médio Oriente por se pensar que basta riscar um papel e desenhar fronteiras, separações virtuais que os corações não sentem.

Morreu muita gente por culpa de um muro que representava mais que isso. Para todos os que lá morreram, o muro era só um muro. Só na RDA (República Democrática Alemã), a parte leste, a parte russa, foram acusados de desertores 75 mil pessoas, que, segundo o código legal da ex-URSS, teriam que ser punidos com dois anos de prisão.

Quando em 1987, Ronald Reagan, discursando em Berlim pede a Gorbatchev que derrube o muro, estendeu à Rússia a mão para a puxar para o Ocidente. E conseguiu. Pelo menos enquanto Gorbatchev liderou. Depois vieram os sacanas, os que já tinham sacaneado antes e que voltaram agora reciclados, pseudo-regenerados. A ex-URSS não podia ter sido democratizada com moldes ocidentais, tal como o Iraque não podia. No Iraque ninguém ganhou; na Rússia ganharam os oligarcas, os interesses pessoais, a máfia, os que agora governam. Reagan disse, nesse mesmo discurso, que “liberdade e segurança caminham juntos, que o progresso da liberdade humana só pode reforçar a causa da paz no mundo”. Nem mais, no entanto, e 25 anos volvidos, os muros que agora se erguem são muitos. Não são de cimento, mas são mais repressivos. Dizemos o queremos, pensamos o que queremos, quase que fazemos tudo o que queremos e quando queremos mudar, quando queremos melhor…nada acontece, porque o “sistema” roubou-nos a liberdade, a força da opinião e da superação; da oportunidade de poder fazer e impor valores mais elevados que aqueles que regem quem nos domina. Temos que agir.

Há 25 anos, na maior cidade alemã e uma das que apresenta um dos maiores PIBs municipais, Berlim, verdadeiros sentimentos de alegria, do mais intrínseco do sentimento humano andavam à solta pelas ruas de Berlim. A liberdade e a felicidade das pessoas era contagiante; bares serviam bebidas gratuitas, as pessoas saudavam-se nas ruas como se fossem melhores amigos apesar de nunca se terem visto; Hitler e a ex-URSS eram só sombras do passado face um futuro que a liberdade pintava a esperança.

O muro que outrora era um empecilho à felicidade, passou a ser um exemplo da luta, da esperança por um mundo melhor e foi enviado para todos os cantos do mundo: no estaleiro de Gdansk na Polónia, no Museu Imperial da Guerra de Londres, no Newseum em Washington, em Nova York, no Hawai, em Buenos Aires, Seul e na casa de milhares de pessoas.

O muro deu nome a um dos mais fantásticos álbuns de uma das maiores bandas de sempre, os Pink Floyd. Mais, em 1990, a mesma banda deu um concerto em Berlim para 350 mil pessoas, naquele que é ainda hoje considerado um dos maiores espetáculos da história da música, profundamente carregado de simbolismo, não era para menos: festejava-se o fim de um medo. Não queremos que ele volte!

Por isso, e para que nos lembremos ainda a tempo de evitar continuar pelo caminho que seguimos, para que não surjam mais muros quando os deveríamos estar a derrubar, hoje, eu festejo a liberdade, a união e o amor da gente à gente; hoje sou mais um entre tantos; hoje “Ich bin ein Berliner”.

"A liberdade é um dos dons mais preciosos que o céu deu aos homens. Nada a iguala, nem os tesouros que a terra encerra no seu seio, nem os que o mar guarda nos seus abismos. Pela liberdade, tanto quanto pela honra, pode e deve aventurar-se a nossa vida." - Miguel de Cervantes

 

Fotografias de: Brittanica.com; AP photo; Bettmann Corbis; Wolfgang Rattay/Reuters