4 Junho 2017      00:58

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OS FILMES DE NATHANIEL DORSKY

"DESVIOS E RESPECTIVOS ATALHOS: FILMES, LIVROS E DISCOS"

Stills

Que filmes estes, e vimos apenas três sabendo desde logo da grande probabilidade de não voltar a ver mais nenhum.

Uma primeira pergunta logo que os começamos a ver: de onde estamos a olhar? – Ou então: para onde fomos levados? Para o topo de uma montanha. Não! Para um espaço intermédio, entre fronteiras apenas pressentidas.

Mais: de que forma devemos olhar? Por exemplo, no segundo filme, Alaya, vemos estruturas de areia que se vão desfazendo, pedras minúsculas arrastadas por um vento silencioso (pois não há qualquer som ou música nestes filmes) e, por isso, de incrível mistério – Formas desfeitas e refeitas que, se as olharmos colocando a mirada no limite da focagem, nos dão uma sensação de vertigem e fuga; e aquilo que foge, espécie de remoinho, é como um aturdimento de contornos iniciáticos. Uma perturbação semelhante àquela que provocam as imagens interestelares, como se voltássemos a observar o local do nascimento sem o compreender na totalidade. Mas isto não foi de certeza pensado objectivamente por Dorsky, foi antes uma reacção do momento pelo espectador meio inebriado e já incapaz de concretizar / corporificar as imagens. São filmes e ainda espaços de liberdade.

A câmara encontra-se subitamente atrás de vidros, ramos, folhas; de baixo para um cima de rostos esbatidos e partes de corpos. Contemplação abstracta para obter algo (uma oscilação) de profundamente místico.

Experiência radical e (com a óbvia excepção da necessidade de público – e ainda assim levada ao mínimo, apenas para validar o projecto cinema) sem cedências. Falemos do público, do ponto mínimo relativo à sua necessidade: não há cópias em DVD para divulgação, as poucas que existem, em 16 mm, não passam regularmente, nem sequer em circuitos alternativos; poucos privilegiados em muito poucos festivais lhes tiveram acesso. Vemos os filmes ou por busca intensa dos mesmos ou pela circunstância de estarmos ali naquele momento – por coincidência.

O olhar-sugestão (passe o exagero, necessário) é tão atípico que é como se pudéssemos por uma vez ver para lá do horizonte de acontecimentos do buraco negro – não saindo luz nem evidência, sobra o místico.

A experiência, então, só pode reverter para uma de duas: ou se sente ou não se sente. São filmes que não se julgam; sentem-se ou não se sentem, repetimos. A beleza que nos é proposta não tem um fim, não se diz sobre, não tem conceito nem sujeito.

E como não os voltaremos a ver, ao fim de algum tempo restará apenas um vislumbre alimentado pela emoção e não pela análise. Podemos regressar à vida sem o temor do esquecimento.

 

Imagem de screenanarchy.com