29 Maio 2016      14:25

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DAS PRAIAS DE ANTIGAMENTE

"CIÊNCIA NA SUA VIDA"

Não vos quero falar das praias do nosso Alentejo que, na década de 70, assistiram a uma chegada massiva de turistas, nacionais e estrangeiros (os tais do “pé descalço”) que revestiam, com pequenas tendas, os nossos campos dunares.

Não vos falarei tampouco das praias alentejanas que, em meados do séc. XX, depois de invernarem, solitariamente, com o mar e o vento eram ocupadas, durante a época estival, pelos “campaniços” que, vindos do interior, chegavam ao litoral em carros de toldo engalanados, puxados por bois e pela vontade de aspirar o ar do mar.

Esses tempos pertencem a um passado recente em que o verão do sudoeste alentejano se fazia da fusão das requintadas matinés de grafonola com os populares bailes de concertina, da mistura, nas areias da praia, de civilizados toldos de lona riscada com os rústicos garrafões de vinho tinto e tachos a transbordar comida.

Esses anos foram vividos nas mesmas praias que frequentamos atualmente, sobre as mesmas rochas, entre as mesmas dunas…

Quero falar-vos de tempos mais longínquos, de areias nunca pisadas por humanos, das praias de antigamente…

Ainda hoje conseguimos ver os resquícios dessas praias, em determinados pontos da nossa costa. Trata-se de antigas praias conservadas, sob a forma de beach rock, um tipo de formação geológica constituída por areia cimentada com calhaus e blocos rolados pelo mar.

São formações incomuns que intrigam muita gente, demarcando-se dos outros tipos de rochas que compõem o nosso litoral. A sua existência, no meio das areias e dos calhaus rolados das praias contemporâneas, atesta o princípio das causas atuais, ou seja, diferentes aspetos geológicos podem ser interpretados segundo processos semelhantes aos ocorrem atualmente.

Estas praias de antigamente eram praias muito semelhantes às que frequentamos atualmente. Para se terem transformado em rocha tiveram que ficar (milhares de anos) a salvo da inquietude das ondas do mar. Tal transformação terá ocorrido durante um período de regressão marinha (relativamente à linha de costa atual).

Já ocorreram diversas regressões marinhas, ao longo dos quase cinco mil milhões de anos de existência do nosso planeta. Acontecem durante os períodos mais frios (glaciações) quando uma quantidade importante de água é transferida do domínio oceânico para as calotes polares, sucedendo uma diminuição do nível médio das águas do mar.

Os períodos de glaciação estão relacionados com fenómenos astronómicos. Ciclicamente ocorrem alterações na posição do nosso planeta, que contribuem para que o clima da Terra não seja constante. Varia a distância Terra-Sol, altera-se a órbita que o nosso planeta descreve em torno do Sol e até varia a inclinação do eixo da Terra. Todas estas oscilações contribuem para uma maior aproximação ou maior distanciamento entre a Terra e a estrela que a aquece, o que se traduz em períodos (que duram milhares de anos) mais ou menos frios.

Destas praias de antigamente, que espreitam entre as rochas das praias atuais, guardemos o vaticínio de que os sedimentos que erguem os castelos de areia e as muralhas de calhaus de hoje se tornarão as praias fossilizadas de amanhã.

 

 

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