12 Dezembro 2015      10:09

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O SEGREDO

PARALELO 9 S

Sentadas à mesa do café, duas mulheres, uma agitava-se na cadeira, impaciente e incomodada. Havia um segredo que precisava contar, mas não sabia como nem conhecia o momento certo em que o poderia contar. A outra mulher olhava-a com olhar expectante e ansioso. Era aquele momento que marcaria a conversa. Que poderia de tão importante ter para falar aquela mulher com a outra? Nenhuma das duas queria dar o primeiro passo e começar a contar ou perguntar o motivo de tão insólito encontro. Havia um segredo, isso já ambas sabiam. A diferença entre elas é que uma sabia o segredo, mas a outra não fazia ideia do que se tratava.

Servidos os cafés que sustinham o suspense, a primeira mulher começou por aclarar a garganta e, introduzindo o tema, começou a conversa pelo tão comum: é assim. E foi assim que começou. Disse primeiro que lhe era muito difícil contar aquilo que iria contar e que lhe parecia que a amiga não devia ficar chocada nem ter uma reação impetuosa ao que iria de seguida ouvir. Disse-lhe que a realidade custa e que não poderá ser aquela conversa que a vai fazer mudar a sua vida, mas que deverá ponderar os seus passos e, além disso, a amizade que as liga é mais forte e que é, por esse motivo, que se sentam naquela mesa. Sentam-se para conversar sobre aquele problema, sobre aquele segredo tenebroso que uma sabe e a outra anseia conhecer.

Durante quinze minutos, que pareciam nunca mais terminar, na cabeça das duas mulheres havia tanta coisa a acontecer. Enquanto uma falava, a outra ouvia e as lágrimas da primeira corriam-lhe pelo rosto. Não havia outra forma de contar e também não havia outra forma de ficar a saber. É a partilha da dor, do sofrimento, é a partilha de algo que alguém não pode saber. A confiança é tudo e as mulheres que se sentavam naquela mesa sabiam que o segredo teria de ficar entre as duas. Era preciso que nunca se soubesse. A mulher continuou a contar aquilo que não queria sair-lhe pela garganta, mas também não queria ficar guardado dentro dela a corroer todas as suas entranhas.

A segunda mulher foi acompanhando as palavras, com os olhos vidrados nos lábios da mulher e naquilo que de lá saía. Foi acompanhando as palavras que lhe ecoavam nos ouvidos e foi perguntando e foi acenando com gestos de complacência e de solidariedade. Serviria de conforto ao lado escuro que o segredo guardava. A conversa teria de terminar, como a dor solitária de carregar um segredo também teria de se superar e passar a ser um ato partilhado entre a amizade das duas mulheres.       

O segredo terminaria ali, pensava a primeira mulher. Tinha de terminar ali, sem mais nada, sem segredos prolongados. A conversa terminou ao fim de quinze minutos e aquela que contou sentia-se aliviada. A partir de agora tudo seria diferente, partilhado, sustentado em quatro ombros. A primeira dirigiu-se à segunda e pediu para que não contasse nunca aquilo que ouvira. Concordaram ambas nisso e despediram-se até um dia. Não se tinham visto, não se voltariam a ver tão cedo.

Poucas horas depois, o telefone de uma terceira pessoa que se sentava no sofá a ver televisão tocou intensamente. Atendeu o telefone e, do outro lado, uma voz perguntou-lhe se estava só e que precisava partilhar algo que não podia ser ouvido. Contou, de seguida, todo o segredo. A partilha não ficou enterrada na conversa, seis ombros sustinham agora o segredo e, de novo, um pedido especial para que não contasse nunca esse segredo, da primeira pessoa. Chocada, a terceira pessoa, desligou o telefone e sentou-se. Tudo era forte de mais. Não podia carregar aquele segredo. Agarrou no telefone e falou com uma amiga. Contou-lhe o segredo. Nesse mesmo dia, o segrego passou a ser sustido por oito ombros. Nesse dia continuou a ser segredo, nos próximos não sabemos. 

 

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