7 Outubro 2015      13:10

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O POPULISMO E... A EDUCAÇÃO FINANCEIRA!

O populismo e… a educação financeira! (já viram que tudo dá para falarmos deste tema?)

Como cidadão politicamente interessado (o que não significa que seja politicamente submisso), gosto de ouvir as diferentes propostas desde os partidos representados na Assembleia da República até àqueles que não têm essa representação. Isso significa que pelo menos uma vez oiço o tempo de antena e vou seguindo, com alguma atenção, as entrevistas que vão acontecendo (mais as da rádio, até porque passo muito tempo dentro do carro).

Há uns dias ouvi um debate com os novos partidos que concorreram a estas legislativas, que são seis. Desde logo me chamou a atenção o facto de metade desses partidos terem pessoas “repescadas”, “foragidas”, “desterradas” de outros partidos. Dos cabeças de lista desses partidos constaram Joana Amaral Dias, Rui Tavares e Marinho Pinto (acrescentem o “e” ao nome se quiserem, que quando ele era bastonário só se dava a conhecer por este nome). Não vou aqui discutir questões de política (pois a minha crónica é de Economia) mas confesso que achei piada a algumas críticas sobre o formato do debate quando ao menos na Antena 1 se abordam todos os partidos ou ao facto de um dos participantes criticar ex-governantes por terem “bazado” dos cargos, quando o próprio desertou do partido pelo qual foi eleito, quer desertar do Parlamento Europeu e, provavelmente, ainda se vai candidatar à Presidência da República. Mas adiante, que esta não é a minha praia.

O que venho falar aqui é de uma proposta avançada até por várias das forças políticas representadas nesse debate: a reestruturação da dívida privada portuguesa.

Factos indesmentíveis: as famílias portuguesas sobreendividaram-se nas últimas décadas; a crise piorou a situação; muitos portugueses ficaram desempregados; muitas famílias deixaram de poder pagar os seus créditos… e podemos acrescentar mais factos a esta situação complicadíssima. O que ouvi (e que está plasmado nalguns planos de governação) é que se deve ajudar as famílias endividadas. E isto, desculpem que me diga, é POPULISMO, FALTA DE VISÃO A LONGO PRAZO, EMPURRAR OS PROBLEMAS COM A BARRIGA. Sim, em letras maiúsculas.

Atenção: não sou insensível a estes problemas. A questão é que o problema vai MUITO MAIS ALÉM.

Obviamente não tenho acesso à proposta é até pode haver algumas soluções interessantes. Tudo o que passe por um alargamento de prazos, por carência de juros e questões do género até acho que pode ser viabilizado. Mas pela conversa o que me parece que é proposto é um género de perdão de dívida. E para mim, tudo o que seja perdão de dívida, peço desculpa mas NÃO! E não porquê? Porque vai gerar desigualdades.

Peço desculpa por utilizar a minha experiência pessoal, mas acho que é a forma mais simples de explicar o meu raciocínio.

Há 10 anos atrás adquiri uma casa recorrendo a um crédito bancário. Sempre paguei as prestações, sem qualquer tipo de problema. Desde as prestações com taxas de juro mínimas (como está agora) até às prestações quando as taxas Euribor ultrapassavam os 5%. Durante estes 10 anos tive várias situações profissionais: bolseiro de investigação (e quem é bolseiro sabe quanto se ganha…), apenas trabalhador por conta de outrem, trabalhador por conta de outrem e trabalhador independente, apenas trabalhador independente (e quem está neste regime sabe o que custa a segurança social). Já estive com contratos apenas a 50%, a 100%. Pago sem atrasos as minhas responsabilidades, entre as quais o IVA, a segurança social (quando devida), o IUC. Pago a casa onde vivo, água, luz, gás e todas as despesas. Durante estes 10 anos tive que adquirir dois automóveis (trabalho e questões familiares assim o obrigaram). Faço milhares de kms por mês para trabalhar (e já fiz mais!) o que acarreta despesas com combustíveis, por vezes portagens e, claro, revisões dos carros. Sofri como todos os cortes nos salários, o aumento do IRS e dos impostos. Tenho obviamente a sorte de estar empregado mas mesmo que ficasse desempregado, continuo com capacidade para assegurar os gastos que tenho, pelo menos a curto/médio prazo. E não, não tenho um salário milionário… (nem nunca tive!).

O que se passa é que eu dimensionei os meus gastos tendo em atenção várias questões. Podia ter comprado uma vivenda, com grandes áreas, com piscina? Podia. Podia ter comprado um Audi ou um BMW? Podia. Podia fazer férias no estrangeiro, em hotéis? Podia. Mas a palavra certa é precaução.

E agora o porquê de não concordar com as propostas como são faladas e o porquê de as considerar populistas.

Obviamente quem tem a corda na garganta gosta de ouvir estas propostas. E pensa: “bem, se votar neles se calhar resolvem-me o problema”. A questão é que cheira-me a que as propostas sejam um paracetamol: tiram as dores mas não curam as doenças (peço desculpa a algum médico se esta analogia não está completamente correta…).

Voltando ao pressuposto que a proposta passa por um perdão de dívida (e reconheço que pode não ser esta, que é apenas uma desconfiança minha), tenho várias questões, entre as quais:

- o perdão de dívida é feito a todos os que têm créditos? Se sim, o que fazer aos que nunca pediram crédito porque sempre dimensionaram as suas contas?

- o perdão de dívida é feito numa percentagem, digamos 10%, do valor do crédito? E quem apenas pediu 50.000€ porque o fez por precaução vai ser prejudicado em relação a quem pediu 200.000€ porque não se preocupou com o futuro?

- o perdão da dívida é só para quem tem a corda na garganta? Então e quem planeou sempre a sua vida?

A chave disto tudo é uma questão bem mais complexa e que até temos tratado antes: é uma questão de EDUCAÇÃO! E o populismo é mesmo isto: é dizer – “Epa, vamos resolver os problemas destas pessoas já e depois logo se vê, não vamos pegar no problema de fundo”. Até porque notícias recentes mostram que os níveis de consumo dispararam nos últimos meses e os níveis de poupança estão em mínimos históricos, depois de terem aumentado durantes os períodos de maior aperto. Como eu sempre defendi, muitas pessoas começaram a poupar porque se sentiram apertadas, mas assi que houvesse folga voltariam as loucuras. Apoiar restruturações de dívida e/ou perdões sem pensar na parte da educação é como restaurar uma casa velha arranjando apenas o teto. Se as paredes também estiverem degradadas e não se fizer nada, mais cedo ou mais tarde a casa cai…

Com conversas destas, muitas pessoas reagem: “Mas isso és tu, que és uma pessoa informada”. Pois é, é apenas isto que eu peço: informação (e ao mesmo tempo formação). Até porque nada do que aplico (e escrevo em relação a este tema) me foi ensinado, mas sim estudado por mim, a minhas próprias expensas. Porque ao contrário do que possam pensar, uma licenciatura em Economia não versa sobre economia doméstica. Aliás, a economia doméstica (educação financeira, finanças pessoais, o que lhe quiserem chamar!) devia ser obrigatória! Mas disto ninguém fala. Não dá votos…

Para terminar, que esta crónica já vai longa: não é um lamento, nem nada que se pareça (e quem me conhece sabe-o), mas eu tenho três filhos. Só para reforçar que uma vida financeira planeada permite encontrar soluções. E sentir-me-ia extremamente injustiçado de ver que algumas pessoas eram apoiadas porque não sabem pensar/planear enquanto outras têm essa preocupação e, porque a têm, não terão nenhum tipo de apoio (nem tão pouco reconhecimento).