17 Abril 2015      12:51

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O LUGAR DA CULTURA

E se o lugar da Cultura fosse em Alvito, no Alentejo? Segundo Jorge Gaspar, Consultor e Professor de Planeamento Regional, Alvito tem Cultura e a Cultura tem lugar em Alvito, e isso é corroborado por várias das iniciativas que apresentou no “Colóquio Cultura e Desenvolvimento – Estudos Cultura 2020”, que integrava o segundo dia do ciclo “O Lugar da Cultura”, a decorrer desde dia 15 de Abril, no Centro Cultural de Belém. Uma iniciática da Secretaria de Estado da Cultura, organizada pelo Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais (GEPAC) e pelo Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA), cujo programa alargado se estende até dia 22 de Abril, podendo consultar o programa aqui.

Dividido por temas, o primeiro dia, com conferências de tema mais abrangente, teve como tema aglutinador “O Lugar da Cultura, Modelos de desenvolvimento para o século XXI”, subdividido em temas como a política, a economia, religião, a ciência e tecnologia, o presento e o futuro. Com um painel de oradores internacionais, que foram questionando até onde e de que forma poderia ir a Cultura. Onde, Enrique Barón Crespo, antigo Presidente do Parlamento Europeu, lembrou e reafirmou as palavras que tinha dirigido face ao projeto Erasmus, sendo “melhor investir em alunos do que em vacas”.

A Educação, e a necessidade da articulação desta com a cultura, esteve presente nos discursos e exposições de vários oradores, como foi o caso de Guilherme d’Oliveira Martins, Presidente do Centro Nacional de Cultura, afirmando que “a Europa precisa de uma política, de economia social, mas também de mais cultura presente nas escolas”. Já Tomás Sedlacek, Economista e autor do livro “Economics of Good and Evil”, deixou-nos a interrogação sobre se estaríamos a viver uma crise “pós-coito”, fazendo a metáfora de uma sociedade em que depois de vários anos “a ordenhar uma vaca” nos sentirmos frustrados por ela parar de dar leite, “sem questionar quanto é que ela já nos deu”. Salientando como a maximização da funcionalidade em que se baseiam as estratégias económicas, por base em indicadores valorativos, nos têm condicionado a uma cultura baixa, instrumentalizada apenas como indicador económico, numa sociedade onde “não trabalhamos para descasar, mas descansamos para trabalhar”. Ainda pela manhã do dia 15, Mário Lúcio Matias de Sousa Mendes, escritor e Ministro da Cultura de Cabo Verde, afirmou que o “maior erro da Europa é considerar a cultura um sector”, pois “não existe ser humano sem que a parte abstrata do seu corpo não seja Cultural” onde o desenvolvimento é feito em função do “desenvolvimento de um Homem melhor”.

Já na parte de tarde, em que se falou, entre outras coisas, de cultura na religião, e vice-versa, D. Carlos de Azevedo deixou-nos o apontamento de que “a Arte não é um pretexto que se possa desleixar” por conduzir “o Homem à Humanidade”. Entre os oradores, também se encontrava o músico e produtor, da banda Buraka Som Sistema, classificado outrora como “agitador cultural”, fez um retrato da agitação cosmopolita que é viver e frequentar diversas cidades pelo mundo inteiro, mencionando que para si a cidade que melhor sabe acolher e receber a mestiçagem e o pluralismo é Lisboa. Seguido do alerta deixado pelo Diretor do Annenberg Innovation Lab, da Universidade da Califórnia do Sul, “confiança cega na tecnologia” sob o facto de que “a Cultura ser mais do que o armazenamento de dados, mas sim a sua interpretação e a crítica à forma como esses dados são obtidos”, e isso é algo apenas ensinado “nas Humanidades”.

Com todos os sucessivos escândalos e descréditos da Banca, nacional e internacional, já pensou em ir a um Banco do Bem Comum? Pois bem, esta foi a proposta do Economista e autor da obra e movimento “Economia do Bem Comum”, que propõe uma inversão dos modelos económicos por base nas Constituições nacionais, que levasse as empresas a basear-se numa avaliação do bem comum que geram e do seu papel na comunidade. Com base em indicadores culturais, em vez da valorização monetária das mesmas. Um papel que demonstrou, também através de várias acrobacias, propondo que passássemos a “medir os sucessos económicos de forma diferente”, num modelo que “devolve democraticamente os efeitos do desenvolvimento, às pessoas”, por fim a “limitar a iniquidade infinita das desigualdades” que o modelo atual comporta.

Por último, e ainda antes dos discursos governamentais, a cereja do dia teve a cabo do Professor Homi K. BhaBha, professor de Humanidades Anne F. Rothenberg e Director do Mahindra Humanities Center da Universidade de Harvard. Que salientou o facto de “o maior contributo da Cultura é fazer as perguntas inconvenientes”, que ninguém quer ouvir, e que “só quando procurarmos um ângulo diferente, fora da nossa visão, do centro, é que iremos conseguir percecionar o colapso do sistema”, onde não podemos esquecer, ou marginalizar as culturas periféricas.

O segundo dia foi dedicado em especial aos estudos coordenados pelo GEPAC, em função do programa Portugal 2020, com vários debates, por forma a perceber e compreender o contexto de Portugal na Europa e no Mundo, e vice-versa. No discurso de encerramento, Jorge Barreto Xavier, Secretário de Estado da Cultura de Portugal, afirmou que “o lugar da cultura deve ser promovido para lá da lógica da economia política”, corroborado pelo Ministro Poiares Maduro, ao salientar que “a Economia tem muito a ganhar com a Cultura”, num programa em que “a prioridade não são os equipamentos, mas sim a programação para esses equipamentos”. Sandis Valdins, Secretário de Estado da Cultura da Letónia, país que detém a Presidência do Conselho da União Europeia, salientou também que na Cultura é possível “combinar sinergias, onde um maior desenvolvimento pode dar aso ao desenvolvimento de melhores condições de emprego e estabilidade económica”.

Uma certeza ficou no ar, por interposto da máxima ontológica e identitária da cultura, é que o seu lugar é em nós.

por João M. Perereirinha