3 Julho 2015      17:27

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D'AZEITE É MADE IN ALENTEJO

Fátima Mégre é a artesã que, nas Falcoeiras, pequena aldeia na extrema do concelho de Redondo com Reguengos de Monsaraz, dá vida a sabonetes e cosméticos naturais amigos do ambiente, feitos a partir de azeite virgem extra e enriquecidos com plantas como a alfazema, o alecrim ou a hortelã, frutos, cereais ou especiarias.

Fomos conhecer um pouco mais acerca da responsável por esta marca D'azeite - sabão artesanal, marca registada com o Selo “ Portugal Sou Eu ” cujos produtos podem ser adquiridos online através da página do Facebook.

 

Tribuna Alentejo: A D’Azeite – sabão artesanal é uma marca de produtos naturais como sabonetes, cosméticos, óleos, entre outros, aprimorados com plantas, frutos, cereais ou especiarias naturais da região Alentejo. Como nasceu esta ideia?

Fátima Mégre: Costumo dizer que a necessidade é a mãe da criatividade. Tinha todo o tempo do mundo, isto é, depois de experimentar o idílico bucolismo de viver numa pequena aldeia, sobravam horas infindas de nada fazer. E lembrei-me que, em tempos, fazia sabonetes para oferecer a amigas e criava perfumes. Decidi voltar a experimentar e foi assim, de hobby passou rapidamente a ocupação a tempo inteiro. A matéria principal estava ali mesmo - azeite e plantas. Foi na Primavera passada, quando o Alentejo explode em flores e aromas, por todo o lado.

Tribuna Alentejo: Como foi a experiência de passar do plano teórico à prática? Que dificuldades encontrou para lançar no mercado este projeto?

Fátima Mégre: Não foi propriamente difícil. Seria até desonesto queixar-me. A informação existe e está disponível. Por vezes, o processo demora mais do que o entusiasmo deseja. Ressalvo, no entanto, que beneficiei da facilidade em compreender os passos a dar e da facilidade no acesso à informação. Esquematizei as etapas obrigatórias - registo da actividade, registo da marca, profissionalização e certificação, criação da UPA (unidade produtiva artesanal), registo da actividade e dos produtos junto da entidade europeia reguladora (CPNP - Cosmetic Products Notification Portal), candidatura ao selo Portugal Sou Eu.

Defendo que a aprendizagem ao longo da vida e a disponibilidade para recriar percursos profissionais são essenciais, sobretudo após os 50 anos! Portanto, não encontrei dificuldades. Talvez alguns obstáculos mas que, removidos, passaram a ser alicerces neste processo de construção. De resto, neste primeiro ano, foi até fácil reinventar-me nesta nova profissão. Os clientes começaram a surgir e a permanecer clientes. Uns trouxeram outros, os amigos ajudaram e os desconhecidos vão aparecendo. E o Facebook como ferramenta de trabalho é um meio extraordinário. Vendo, actualmente, para Espanha, Alemanha, Holanda, Reino Unido, Suécia, Japão, EUA e no mercado interno, sempre através do Facebook.

Tribuna Alentejo: A Fátima é alentejana? Qual a sua relação com o Alentejo?

Fátima Mégre: Sou alentejana do Redondo há dois anos! Nasci nos Açores mas vivi sempre no Continente. Aliás, sou filha de pais continentais e açoriana por acidente... Tinhamos casa para fins de semana nas Falcoeiras e, há dois anos, decidimos que passava a morada permanente. A minha relação com o Alentejo é de paixão, em vários sentidos... (risos)... amo a comida, aprecio alguns bons vinhos, faz-me bem a paisagem que nos surpreende a cada passo, o céu amplo, casei em Reguengos de Monsaraz... uma relação cheia de nuances e matizes...

Tribuna Alentejo: Sente que a sua formação contribuiu de alguma forma para o desenvolvimento desta marca? A sua formação é nesta área?

Fátima Mégre: Acredito que a formação é sempre transversal e, como tal, contribuiu. Evidentemente. Se não directamente, contribuiu porque nenhum conhecimento é estanque e os saberes, mesmo os informais, são as ferramentas que nos permitem ir onde queremos. Ou precisamos. Quanto à formação académica, não tem nada a ver. Sou licenciada em Linguas e Literaturas Clássicas e pós graduada em Edição e Tradução de Textos Clássicos, pela FLUL, e em Relações Internacionais, na UAL. Mas a formação não se esgota, ou nem se esgota melhor dizendo, na formação académica. Aprendemos e sabemos tanta coisa à margem da escolaridade. Creio mesmo que os saberes informais deveriam ser mais valorizados e apoiados como forma de combater o desemprego. Assim como o respeito pelas profissões e os profissionais que, sendo a maioria motriz da economia, não se encaixam nos "molhos de doutores" nacionais... Enfim, este tema levar-nos-ia além da sua entrevista... 

Tribuna Alentejo: Fale-nos um pouco do processo de fabrico e de conceção dos seus produtos...

Fátima Mégre: O processo é artesanal, exclusivamente artesanal. Quase alquimico... (risos). Quando iniciei esta aventura, fui ler tudo quanto podia, desde antigos alfarrabios de botânica e farmacopeia - uso por exemplo a receita galénica para os cosméticos - a ensaios sobre o azeite e as suas propriedades. Esclareci (e esclareço) dúvidas junto de amigos, peritos em cada área. Mais importante, ou tão importante quanto a concepção dos produtos é não esquecer jamais que estes são produtos para aplicar na pele, o maior órgão do corpo humano, e, como tal, respeitar a saúde alheia, criando produtos verdadeiramente naturais, orgânicos e adequados, escolhendo a qualidade e trabalhando com brio. Por isso é que os rótulos ostentam o meu nome próprio e a marca, sou responsável pelo produto que coloco no mercado. São exactamente aquilo que dizem ser e são feitos com ingredientes que todos conseguem dizer e conhecem.

Tribuna Alentejo: Para além da venda online há algum espaço físico onde seja possível adquirir os produtos desta marca?

Fátima Mégre: Neste momento, por opção, estão à venda onlne apenas. Brevemente estarão em loja. Mas com calma e sensatez tudo se faz.

Tribuna Alentejo: Que produtos são mais procurados e por quem? Sente que a procura é maior por pessoas da região... por turistas...

Fátima Mégre: Ultimamente, com a proximidade do Verão, a procura de esfoliantes, cremes corporais, protectores solares e óleos para depois do sol tem sido, felizmente, muito grande. Mas os sabonetes, os cremes de barbear, as Águas de Cheiro (eaux de parfum), os desodorizantes, os bálsamos labiais, os cremes para mãos, as loções faciais de mel e os cremes faciais têm uma procura constante. Pessoas da região? Tenho clientes em Évora, Portalegre, Reguengos, Beja... Turistas? Directamente, não. Forneço duas unidades hoteleiras da região e, aí sim, os turistas conhecem os meus produtos. 

Tribuna Alentejo: Há uma equipa por trás desta marca ou a Fátima trabalha sozinha?

Fátima Mégre: Não há equipa alguma, criei a marca, os produtos, as embalagens, trato das encomendas, das compras, etc. Foi um ano trabalhoso, desafiante, compensador. Mas chegou a ocasião de crescer um bocadinho e, a partir deste mês, criei um posto de trabalho. Estou apostada em dar passos seguros, mesmo que, por vezes, me apetecesse ir mais depressa. Nesses momentos, oiço uma vozinha (risos) que teima em repetir "depressa e bem..." Como, para bom entendedor, meia palavra basta...

Tribuna Alentejo: O que espera para a D’Azeite a médio longo prazo? Há outros produtos que pensa desenvolver?

Fátima Mégre: claro que há outros produtos para desenvolver! Haverá outros que vou deixar pelo caminho, já deixei. Quando comecei, fiz sabonetes de leite de cabra. Entretantoo, soube que havia uma marca de Evora que já os fazia e decidi que não valia a pena, numa mesma região, estar a fazer mais do mesmo. É uma questão de ética. Se há oferta de um bom produto não faz sentido concorrer com a mesma oferta. A economia para ser sustentável, na minha perspectiva, nem deve ser auto sustentável nem cegamente concorrencial. Deve ser inteligente, solidária e orientada par um lucro justo. A médio/longo prazo.... trabalhar para ser uma marca de cosmética e higiene natural, alentejana, respeitada e conceituada.

Tribuna Alentejo: Sente que vale a pena lançarmo-nos nos nossos próprios projetos e acreditarmos que é possível?

Fátima Mégre: obviamente que sinto. Nunca me senti profissionalmente tão realizada. Nem quando lancei os meus livros. Era muito diferente. Criar um projecto, desenvolvê-lo e vê-lo crescer é como ter e criar um filho, é preciso tempo, paciência e dedicação. Mas vale a pena!