22 Novembro 2015      10:39

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ÚLTIMA HORA: BATACLAN DE DEATH METAL EM PÓVOA DE LANHOSO

Nos últimos tempos, apesar de não assistir com frequência a programas televisivos, tenho vindo a aperceber-me de que, contra as advertências da minha mãe, afinal eu tinha razão, na televisão aprende-se pouco. Para mim, é apenas um mero instrumento de lazer, por isso é que só me sento alguns minutos por semana frente ao televisor, vendo muitas vezes já para dentro (para desespero do companheiro) alguma série ou filme.

É verdade que sempre me disseram que ver séries ou desenhos animados não tem qualquer interesse, porquanto ver as notícias é, supostamente, muito mais instrutivo, na medida em que permite manter-me informada daquilo que ocorre no mundo. Até tento concordar e não me oponho a esse sentimento globalizante que determina a nossa pertença à raça humana, no entanto, tenho algumas reservas, já que nem toda a informação é relevante e fidedigna.

Segundo Roman Jakobson e os restantes seres humanos, a linguagem serve para comunicar e, nas aulas de Linguística, as digníssimas professoras ensinaram-me que a linguagem tem várias funções comunicativas: a função referencial ou informativa; a função emotiva ou expressiva, através da qual se transmitem opiniões e sentimentos; a função apelativa, muito usada na publicidade (“Vá para fora cá dentro”); a função fática, através da qual podemos averiguar se o nosso interlocutor percebe o nosso raciocínio (certo?); a função poética em que nos centramos no prazer estético do texto e a função metalinguística, pela qual, como agora, falamos sobre a linguagem.

No que diz respeito à primeira, a função informativa, pressupõe-se que a mensagem é centrada na transmissão objetiva da realidade, o que corresponde, como é óbvio, ao nosso horizonte de expetativa relativamente aos serviços de informação. Contudo, hoje em dia, os media não são propriamente sinónimo de informação esclarecida e objetiva. Ademais, diria que muitas vezes demonstram ter uma visão altamente fantasista e muitíssimo criativa da realidade.

Dou-vos alguns exemplos: a conhecida banda “Eagles of Death Metal” que estava a tocar no Bataclan no dia treze de novembro em Paris, não é uma banda de tributo aos Eagles, nem é uma banda de “metal”, muito menos uma orquestra satânica, como se ouviu nos media, em Portugal e não só, nos últimos dias. Nem vou aqui perder muito tempo com a genial analogia entre o facto de os terroristas terem atacado uma sala de concerto durante a atuação de uma suposta banda de “metal” e entre as técnicas de interrogatório usadas pelos americanos em Guantanamo.

Outro exemplo, como o ouvi do Nuno Markl, no programa radiofónico “O Homem que mordeu o Cão”: num canal de televisão espanhol, durante uma análise política alegadamente muito séria, explicando de onde provinha o grupo armado Al Qaeda, o jornalista, usando uma animação no computador, mostrou, em vez do logotipo do referido bando, o da Aliança Rebelde da saga cinematográfica “A Guerra das Estrelas”. E agora perguntamo-nos legitimamente: a que função da linguagem podemos atribuir estas mensagens? Temos que criar outra: a pseudoinformativa (que resulta da falta de profissionalismo e cujo objetivo não é só a atividade vulgarmente conhecida como “encher chouriços”, mas também, e, sobretudo, com requinte de malvadez, “endrominar”). Do mesmo modo, poderíamos incluir nessa função a brilhante entrevista de um dos nossos canais de televisão em Póvoa de Lanhoso da vizinha da tia da progenitora de um dos terroristas parisiense luso-descendente. Talvez se justifique esse tipo de entrevista por falta de verbas (Póvoa de Lanhoso sempre fica mais perto que Paris).

Em jeito de conclusão, e já que recorri a dois exemplos que evocaram indiretamente os atentados dos últimos dia em Paris, quero expressar aqui a minha profunda tristeza pelos meus compatriotas franceses que morreram ou ficaram feridos numa esplanada a tomar café com amigos; que assistiram ao horror da chacina e que pensaram que a sua vida terminaria ali mesmo, naquela sala de concerto; aos que perderam familiares ou amigos nessa tragédia e aos que socorreram heroicamente os que estavam em perigo. Quero homenageá-los e honrar a sua memória com três simples palavras: “amour, paix et rock’n’roll”.